Papa Francisco responde aos jornalistas sobre a dignidade da vida, a guerra na Terra Santa e o problema climático

No voo de Singapura de volta para Roma, dia 13 de setembro, o Papa Francisco conversou com os jornalistas a bordo e respondeu muitas perguntas.

De todas, publicamos três, na qual o Santo Padre diz que expulsar migrantes e matar crianças vai contra a dignidade humana; a situação dramática na Terra Santa, pois há mais de 41 mil vítimas em Gaza; e ainda a os países que hesitam em fazer a transição para a ‘energia verde’. Veja a entrevista:

 

Anna Matranga, da CBS News – Santidade, o senhor sempre falou em defesa da dignidade da vida. Em Timor Leste, que é um país com uma taxa de natalidade muito elevada, disse sentir pulsar e explodir a vida para as muitas crianças. Em Singapura, falou em defesa dos trabalhadores migrantes. Tendo em vista as próximas eleições nos Estados Unidos, gostaria de lhe perguntar: que conselho pode dar a um eleitor católico que tem de decidir entre um candidato a favor da interrupção da gravidez e outro que gostaria de deportar 11 milhões de migrantes?

Papa Francisco – Ambos são contra a vida, tanto aquele que joga fora os migrantes quanto aquele que mata crianças. Ambos são contra a vida. Não se pode decidir. Eu não sou estadunidense, não irei votar lá. Mas sejamos claros: tanto não dar aos migrantes a capacidade de trabalhar quanto não dar hospitalidade aos migrantes é um pecado grave. No Antigo Testamento há um refrão: o órfão, a viúva e o estrangeiro, ou seja, o migrante. São os três que o povo de Israel deve proteger. Falha quem não cuida do migrante, é um pecado; um pecado também contra a vida e as pessoas. Celebrei missa na fronteira, perto da diocese de El Paso. Havia muitos calçados de migrantes, eles acabaram mal ali. Hoje, existe uma corrente migratória dentro da América Central; muitas vezes são tratados como escravos porque se aproveitam disso. A migração é um direito que já existia na Sagrada Escritura e no Antigo Testamento. O estrangeiro, o órfão e a viúva, não se esqueçam disso.

Depois, o aborto. A ciência diz que no mês da concepção todos os órgãos do ser humano estão presentes. Todos. Fazer um aborto é matar um ser humano. Goste ou não da palavra, mas é matar. A Igreja não é fechada porque não permite o aborto, a Igreja não permite o aborto porque mata. É assassinato, é assassinato! Devemos ser claros sobre isto: mandar embora os migrantes, não deixá-los se desenvolverem, não deixá-los ter uma vida, é uma coisa ruim, é maldade. Tirar uma criança do ventre da mãe é assassinato, porque existe vida. Devemos falar claramente sobre essas coisas. “Não, mas, porém…”. Sem “mas, porém”. As duas coisas são claras. O órfão, o estrangeiro e a viúva. Não se esqueça disso.

 

Anna Matranga, da CBS News – Na sua opinião, Santidade, pode haver circunstâncias em que seja moralmente admissível votar num candidato a favor da interrupção da vida?

Papa Francisco – Na moral política, geralmente se diz que não votar é ruim, não é bom. É preciso votar. É preciso escolher o mal menor. Quem é o mal menor? Aquela senhora ou aquele senhor? Não sei, cada um em sua consciência pense e faça isso.

Mimmo Muolo, do Avvenire – Existe o perigo de que o conflito em Gaza se estenda também para a Cisjordânia. Houve uma explosão há poucas horas que causou a morte de 18 pessoas, incluindo alguns funcionários da ONU. Quais são os seus sentimentos neste momento e o que o senhor gostaria de dizer às partes em guerra? Existe a possibilidade da mediação da Santa Sé para alcançar um cessar-fogo e a paz desejada?

Papa Francisco – A Santa Sé está trabalhando nisso. Uma coisa eu lhes digo: todos os dias ligo para Gaza, para a paróquia de Gaza. Ali, dentro do colégio, há 600 pessoas: cristãos, muçulmanos… mas vivem como irmãos. Eles me contam coisas ruins, coisas difíceis. Não posso qualificar se esta ação de guerra é muito sangrenta ou não. Mas vemos os corpos de crianças mortas, vemos que, por presunção, há ali alguns guerrilheiros, e se bombardeia uma escola. Isso é ruim, é ruim, é ruim.

Às vezes se diz que é uma guerra defensiva, mas às vezes eu acredito que é uma guerra… demais, demais. Peço desculpas por dizer isso, mas não creio que estejam sendo tomadas medidas para estabelecer a paz. Por exemplo, em Verona, tive uma experiência muito bonita. Um judeu, cuja esposa tinha morrido num bombardeio, e um de Gaza, cuja filha tinha morrido, e ambos falaram de paz, se abraçaram, deram um testemunho de fraternidade. Eu digo o seguinte: a fraternidade é mais importante do que a morte de um irmão. Fraternidade, dar as mãos. No final, quem vencer a guerra encontrará uma grande derrota. A guerra é sempre uma derrota, sempre, sem exceção. Não podemos nos esquecer disso. É por isso que tudo o que se faz pela paz é importante. Quero dizer uma coisa, talvez seja uma pequena intromissão na política: sou muito, muito grato pelo que o rei da Jordânia faz. Ele é um homem de paz. O rei Hussein é um homem bom.

Josie Bonifasius Susilo, do Kompas.ID – Obrigado, Santo Padre! Alguns países estão começando a distanciar-se do seu compromisso com o Acordo de Paris por motivos econômicos, especialmente após a pandemia. Vários países hesitam em fazer a transição para a ‘energia verde’. O que o senhor pensa sobre essas questões?

Papa Francisco – Acho que o problema climático é grave, é muito grave. Em Paris (COP21 em 2016) foi o ponto culminante. Depois, os encontros sobre o clima têm decaído. Fala-se, fala-se, mas nada se faz. Esta é a minha impressão. Falei sobre isso nos dois escritos: Laudato si’ e Laudate Deum.

 

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