EMERJ realiza o 1º Seminário de Direito Romano e Direito Canônico

No dia 30 de setembro, o Fórum Permanente de História do Direito e o Núcleo de Pesquisa em Direito Comparado (Nupedicom) do Observatório de Pesquisas Bryant Garth, todos da Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro (EMERJ), realizaram, o “1º Seminário de Direito Romano e Direito Canônico”, com o tema “Um Diálogo Histórico”.

O evento, organizado em parceria com o Pontifício Instituto Superior de Direito Canônico (PISDC) e o Instituto dos Magistrados do Brasil (IMB), aconteceu presencialmente no Auditório Desembargador Paulo Roberto Leite Ventura, no Rio de Janeiro, com transmissão via plataforma Zoom e tradução simultânea para a Língua Brasileira de Sinais (Libras).

 

Abertura

O diretor-geral da EMERJ, desembargador Marco Aurélio Bezerra de Melo, professor do Programa de Pós-Graduação em Direito da Universidade Estácio de Sá (PPGD/Unesa) e doutor em Direito pela Unesa, destacou: “Estou muito feliz por estar presente neste evento tão histórico e importante, que reúne o Direito Canônico e o Direito Romano. Gostaria de saudar o presidente do Fórum, desembargador Carlos Gustavo Direito, que tem promovido eventos extraordinários e, com grande satisfação, nos aproxima desses dois ramos do Direito. O Direito Romano é centrado em institutos que ainda temos, como a propriedade, o contrato e a família, além do Direito Sucessório. Por sua vez, o Direito Canônico, que emergiu na Idade Média, traz uma roupagem mais humana, vinculada aos ensinamentos de Cristo. Quero também saudar e agradecer a presença do Cardeal Dom Orani João Tempesta, que é um amigo da nossa Escola e do nosso Tribunal. É uma honra enorme para a EMERJ ter nosso querido Arcebispo da Arquidiocese de São Sebastião do Rio de Janeiro conosco, emprestando-nos a sua luz”.

“É com grande alegria que participo da mesa de abertura do 1º Seminário de Direito Romano e Direito Canônico, com o tema ‘Um Diálogo Histórico’. É com satisfação que nos reunimos para realizar este diálogo tão importante entre dois campos da esfera jurídica: o Direito Romano e o Direito Canônico. Sabemos que o Direito nasce da necessidade da sociedade e tem por objetivo salvaguardar o bem comum. A vida em um coletivo social exige um ordenamento capaz de garantir o bem-estar das pessoas, da sociedade e dos distintos grupos que a compõem. Com esse objetivo, os romanos foram elaborando suas leis e constituindo organismos tanto para a aplicação da lei quanto para o julgamento de seu cumprimento. Dessa forma, assistimos ao surgimento do Senado e do Fórum romano. Dois mil anos atrás, quando o cristianismo surgiu, ele encontrou uma cultura já bem sedimentada, a do Império Romano, que, por sua vez, era tributária da cultura e da filosofia grega. Esse período, conhecido como Pax Romana, é tido como uma era áurea da expansão romana no velho mundo”, pontuou o Arcebispo da Arquidiocese de São Sebastião do Rio de Janeiro, Dom Orani João Cardeal Tempesta, grão-chanceler do PISDC.

O vice-presidente do Conselho Consultivo da EMERJ, desembargador Cláudio Luís Braga Dell’orto, magistrado supervisor de Tecnologia da Informação da EMERJ e mestre em Ciências Penais pela Universidade Candido Mendes (UCAM), salientou: “Hoje é um momento histórico. Esta 67ª reunião do Fórum Permanente de História do Direito ficará registrada por sua interlocução entre o Direito Canônico e o Direito Romano. Este diálogo histórico, recuperado por este Fórum, é um espaço para estreitarmos ainda mais as relações com o PISDC, cujo grão-chanceler é Dom Orani João Cardeal Tempesta, que está oferecendo um curso de mestrado em Direito Canônico para aprofundarmos ainda mais nossos conhecimentos. O Direito Canônico não rejeitou o Direito Romano, pelo contrário, o incorporou, reconhecendo os valores técnicos e jurídicos que já estavam presentes nas normas romanas, as quais regulavam a vida em sociedade naquela época. Assim, a formação do Direito Canônico e sua evolução estiveram em paripassu com a evolução do Direito Romano e, posteriormente, com a incorporação dessas regras do Direito Romano por outras legislações codificadas ao longo da Europa, especialmente no modelo ocidental cristão, que nos chegou através dos portugueses, com suas ordenações, sempre bebendo da fonte do Direito Romano e com uma forte influência do Direito Canônico”.

O presidente do Fórum, desembargador Carlos Gustavo Direito, coordenador do NUPEDICOM e doutor em História pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), reforçou: “Como o próprio nome indica, hoje estamos realizando o 1º Seminário de Direito Romano e Direito Canônico, o que significa que teremos um segundo, terceiro e quarto seminário, até que se torne uma tradição termos aqui na EMERJ um evento dedicado ao debate e à discussão do Direito Romano e do Direito Canônico. Essas duas áreas do conhecimento são como irmãos: uma mais antiga e a outra mais recente, mas sempre em diálogo. O Direito Canônico trouxe ao Direito moderno importantes institutos, muitos dos quais são considerados de vanguarda, como a Teoria da Imprevisão, que vem do Direito Canônico. Então, é com muita alegria que realizamos este primeiro seminário, com o objetivo de discutir, trazer ideias e ouvir debatedores, para que essa prática se consolide como uma tradição na EMERJ. Mais uma vez, gostaria de agradecer a presença do nosso querido diretor-geral, desembargador Marco Aurélio Bezerra de Melo, que inovou no Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro e trouxe novos ares à EMERJ. De forma dedicada e intelectualizada, ele elevou a EMERJ a um patamar extremamente importante no estudo do Direito, especialmente voltado para os magistrados, que é também o objetivo da instituição”.

“A Igreja nunca quis impor seu ordenamento jurídico a nenhuma nação. Nosso ordenamento nasce fundamentado na dignidade e na liberdade da pessoa humana. A fé nunca é uma imposição, portanto, a legislação também não é. Em 1992, o então Cardeal Ratzinger apresentou o Catecismo da Igreja Católica em sua fala na Basílica de São João de Latrão, afirmando: ‘Está aqui o catecismo, ou seja, o compêndio das normativas morais e religiosas dos dogmas da Igreja’. Assim, devemos atrair os fiéis para as belezas das normativas, sendo essa beleza o próprio Cristo, que diz: ‘Quem me ama, segue os meus mandamentos’. Portanto, a primeira característica do Direito Canônico é valorizar a dignidade da pessoa humana”, ressaltou, o monsenhor José Gomes Moraes, diretor do PISDC e doutor em Direito Canônico pela Universidade de Lugano.

 

Painel I

O padre Demérito Gomes da Silva, vigário judicial, presidente do Tribunal Eclesiástico de Niterói e mestre em Direito Canônico pelo PISDC, destacou: “Gostaria de expressar a honra de participar deste 1º Seminário de Direito Romano e Direito Canônico, com o tema ‘Um Diálogo Histórico’. É amplamente reconhecido entre juristas o fato da existência de uma relação mútua e enriquecedora entre o Direito Canônico, o Direito da Igreja Católica, e o Direito Romano, assim como a ampla incidência desses dois direitos nos ordenamentos de diversas nações, incluindo o próprio Direito Brasileiro. No entanto, há uma certa incompreensão acerca da autonomia e especificidade do Direito Canônico em relação ao Direito Romano. Sendo este o primeiro seminário histórico sobre essas duas esferas do Direito, gostaria de fazer um breve panorama da história do Direito Canônico e também desenvolver a compreensão que a própria Igreja tem sobre seu direito”.

“A expressão ‘A Igreja vive na lei romana’ tem seu primeiro registro em uma coleção de leis germânicas do século VII. Este é o assunto sobre o qual gostaria de falar brevemente: de que maneira o Direito Romano influenciou o Direito da Igreja, ou seja, qual foi o papel desempenhado pela Igreja na preservação e na transmissão do Direito Romano. Por que esse assunto me parece importante? Porque há uma ideia, mais ou menos generalizada, de que o Direito Romano desapareceu, ao menos no Ocidente, com a queda do Império Romano em 476, e que foi, quase que magicamente, redescoberto nas universidades italianas do norte da Itália a partir do século XI. Nesse período, entre a queda do Império Romano do Ocidente e a redescoberta no século XI, muitos pesquisadores chamam essa época de Idade das Trevas”, disse, Renato Beneduzi, professor de Direito Romano e Direito Processual na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio) e doutor em Direito pela Universidade de Heidelberg.

A professora de Direito na Fundação Getúlio Vargas de São Paulo (FGV-SP), Viviane Ferreira, professora convidada na Universidade de Poznan e doutora em Direito pela Universidade de Heidelberg, reforçou: “Para tratar da relação entre o Direito Canônico e o Direito Romano na Idade Média, escolhi o instituto da Cláusula Rebus Sic Stantibus. No início, já foi apresentada a questão da teoria da imprevisão como uma criação do Direito Medieval e, de fato, é um instituto que surgiu na Idade Média por meio da interação entre o Direito Romano e o Direito Canônico. Essa interpenetração entre essas duas camadas do Direito, que eram simultaneamente vigentes na Europa medieval, resultou na atualização do Direito Romano clássico e na possibilidade de alteração e revisão de contratos válidos e eficazes. A Cláusula Rebus Sic Stantibus é um instituto que ainda temos hoje; dela advém a teoria da imprevisão e todas as hipóteses relacionadas à alteração e atualização de contratos válidos e eficazes”.

A coordenadora do Núcleo de Práticas Jurídicas da PUC-Rio, Ana Paula Santoro Pires de Carvalho Almeida, professora de Direito Romano na PUC-Rio e mestra em Direito pela UFRJ, participou da mesa como debatedora.

 

Painel II

O padre Vitor Pimentel, vice-chanceler da Cúria da Eparquia de Nossa Senhora do Paraíso, advogado canônico no Tribunal Eclesiástico no Rio de Janeiro e mestre em Direito pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), ressaltou: “Como eu imaginei que a maioria das palestras abordaria os temas de maneira mais panorâmica, quis quebrar um pouco essa lógica e trazer um tema mais pontual, embora de extrema importância, que talvez represente uma via reversa. Falamos muito sobre a influência do Direito Canônico no Direito Civil e no Direito Romano, e aqui falarei da influência da técnica jurídica do Direito Romano na formulação do conceito de personalidade jurídica da pessoa natural no atual Código de Direito Canônico. O cuidado que devemos ter é que o Código não diz que somente após o batismo temos uma pessoa humana. De forma alguma. Somente após o batismo temos a imputação de direitos e deveres próprios dos cristãos. Mesmo o ordenamento canônico reconhece os Direitos Humanos Fundamentais a qualquer ser humano, independentemente de ser membro ou não da Igreja. Isso é algo que é pouco falado, mas achei interessante trazer aqui hoje para deixar claro que estamos falando de uma forma reversa, em que a técnica romana ajudou a plasmar de maneira formal um conceito jurídico canônico.”

 

“A Igreja Católica de Roma e o Império Romano são as maiores instituições que o mundo já conheceu, muito maiores do que o próprio império americano que vivemos hoje. Ambos têm coisas em comum, como, por exemplo, a vocação universal. A Igreja Católica trouxe o cristianismo e essa revolução de ser a primeira religião universal do mundo, enquanto as religiões da antiguidade eram, em sua maioria, nacionais. Quando um país entrava em guerra com outro, eram os deuses de cá contra os deuses de lá, uns guerreando contra os outros. O cristianismo, por sua vez, abriu as portas para todos que quisessem adotar sua lei básica, que é a boa nova. O Império Romano, ao contrário de um mero país ou nação, também possui uma vocação universal, e ambas as instituições têm uma vocação à eternidade”, concluiu o juiz João Marcos de Castello Branco Fantinato, vice-presidente do Fórum Permanente de História do Direito e mestre em História do Direito pela Universidade Clássica de Lisboa.

O monsenhor André Sampaio, especialista em História das Relações Internacionais pela Uerj e doutor em Direito Canônico pela Pontifícia Universidade Gregoriana de Roma (PUG), participou da mesa como debatedor.

 

Homenagem

Durante o evento, o Arcebispo da Arquidiocese de São Sebastião do Rio de Janeiro, Dom Orani João Cardeal Tempesta, grão-chanceler do PISDC, recebeu uma placa em reconhecimento e homenagem aos seus 50 anos de sacerdócio.

 

Departamento de Comunicação Institucional do EMERJ

 

 

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