Cardeal Tempesta: ‘Agradecemos a Deus pela vida e missão do Papa Francisco’

(Homilia do Cardeal Orani João Tempesta na missa em sufrágio à alma do Papa Francisco, na Catedral de São Sebastião, no dia 21 de abril de 2025)

 

Caríssimos irmãos e irmãs, o Papa Francisco voltou para a casa do Pai às 2h35 (horário de Brasília) desta segunda-feira da Oitava de Páscoa, 21 de abril, aos 88 anos, após sofrer derrame cerebral, coma e parada cardiorrespiratória irreversível, em seu apartamento na Casa Santa Marta.

Ele esteve no meio de nós em 2013, nesta mesma Catedral de São Sebastião, no Rio de Janeiro, completamente lotada, inclusive de argentinos, para a Jornada Mundial da Juventude, em sua primeira viagem apostólica internacional, que também reuniu, na Missa de Envio, mais de 3,7 milhões de jovens na Praia de Copacabana.
No Domingo de Páscoa, às vésperas de sua morte, na última aparição pública, por ocasião da leitura de sua mensagem “Urbi et orbi” (“Para a cidade de Roma e para o mundo”), o Santo Padre ao desejar uma “Boa Páscoa” aos fiéis, deixou uma bênção no mesmo lugar, na varanda da basílica vaticana, onde foi apresentado como Pontífice.
Para a surpresa dos fiéis, após a bênção de Páscoa, o Papa deu um giro em carro aberto na Praça de São Pedro, lugar emblemático de sua trajetória e símbolo de sua proximidade com o povo. É a mesma praça que durante a pandemia da Covid-19 atravessou sozinho, e mesmo estando vazia, ele abraçou o mundo inteiro.

Nesta celebração, rezamos em sufrágio de sua alma, unidos com toda a Igreja presente no mundo inteiro, e também por aqueles que, de certa forma, foram atingidos pelo seu ministério petrino. Cremos na vida que não termina com a morte, e ao celebrarmos a ressurreição de Cristo, temos a certeza da bem-aventurança eterna junto de Deus.
A vida do Papa Francisco foi gasta a serviço do Evangelho mesmo no sofrimento, quando a saúde lhe impôs limites. Ele concluiu sua caminhada nesse mundo, e agora, que seus olhos abriram para a eternidade, nós agradecemos a Deus pela sua vida e missão. Ao mesmo tempo em que pedimos a Deus que o acolha em Sua glória, também pedimos que o Papa reze por todos nós enquanto Igreja, para que possamos continuar nossa missão.

A Igreja continua a celebrar a ressurreição de Cristo na oitava de Páscoa e depois com 50 dias do tempo pascal. O grande anúncio, como diz São Pedro (At 2,14-32), é que somos testemunhas de que Deus está vivo no meio de nós. É o anúncio que a Igreja fez e faz em todas as épocas, e justamente foi a grande missão do Papa Francisco, que representa Pedro, de confirmar os irmãos na fé, de ser um sinal de quem busca e tem Cristo como o centro da vida.
O início do pontificado do Papa Francisco, em 2013, foi marcado pelo anúncio do Evangelho da alegria, o Cristo vivo e ressuscitado. Ele nunca teve dificuldade em conversar com outras religiões, culturas e demais cristãos. Ao promover o diálogo ecumênico e inter-religioso, estendeu pontes, sempre centrado na figura de Jesus Cristo. No documento “Christus Vivit”, dedicou capítulos inteiros à paixão, morte e ressurreição de Cristo, reafirmando a centralidade do querigma na missão da Igreja.

Em sintonia com o Papa na sua visão social de promover a fraternidade universal, de acordo com a “Fratelli Tutti”, de sempre ter o olhar voltado aos pobres e marginalizados, de promover a cultura do encontro em oposição à cultura do descarte, inauguramos no domingo de Páscoa, na Catedral, o Centro Social São Sebastião, e também oferecemos almoço para mais de três mil pessoas, na perspectiva de dar dignidade e esperança aos nossos irmãos moradores em situação de rua.

Coerente com a missão que recebeu como sucessor de Pedro, o Papa sempre esteve atento às necessidades do mundo. Nas visitas apostólicas, encontros com autoridades, discursos e mensagens, não cansou de clamar por paz, afirmando que o mundo vive uma guerra em pedaços e que ela sempre é uma derrota.

Ao mesmo tempo, buscou uma maior transparência no interno da Igreja, promovendo a reforma da Cúria romana, com a preocupação de uma Igreja santa, acolhedora e de testemunho. Agora, sua voz continua por meio de tudo o que ele falou, escreveu, promoveu ou deixou como legado, chamando a atenção da Humanidade para os aspectos pelos quais viveu, lutou, entregou e gastou a sua própria vida.

Durante o tempo que o Papa esteve entre nós, na Jornada Mundial da Juventude, observou-se uma trégua na violência urbana e uma atmosfera de paz e respeito que tomou conta no Rio de Janeiro. Não houve tanta violência na cidade e até os assaltos diminuíram. O motorista, na chegada à cidade, errou o caminho e eles caíram em meio a um trânsito pesado, mas não aconteceu nada, pelo contrário, o Papa foi saudado e acolhido pelo povo. Estávamos vivendo uma época de manifestações e contestações, mesmo assim, foi uma semana bem-aventurada.

Tive a alegria de sentar à mesa com o Papa no café da manhã, no almoço ou no jantar, junto com ele também no Papamóvel e no helicóptero que nos transportava aqui e acolá. De coração aberto, partilhava suas preocupações em manter a proximidade com o povo, e que o povo tivesse confiança na Igreja. Era desejo de seu coração de uma “Igreja em saída” e que os pastores tivessem o cheiro das ovelhas.

O Papa se mostrou próximo ao povo, visitou comunidades, conversou com os necessitados, e deixou sua marca de humildade e ternura. Nos encontros em Roma, ele sempre recordava de sua bela experiência do Rio de Janeiro e mandava uma bênção especial. O povo da Cidade Maravilhosa ficou marcado no seu coração. Agora, na eternidade, pedimos que o Papa Francisco leve o nosso coração e a nossa cidade no seu coração, e continue pedindo a Deus, Pai de todas as misericórdias, por todos nós e por esta cidade que ele conheceu muito bem, para que ela possa ter justiça, paz e fraternidade. Uma cidade onde as pessoas possam conviver em paz umas com as outras, que sejam respeitadas, vivam com dignidade, e que continue no mesmo clima que ele trouxe durante a Jornada Mundial da Juventude.
Nesta semana, o corpo do Papa será exposto na Basílica de São Pedro para veneração pública, e será sepultado, como pediu, na Basílica de Santa Maria Maior, em Roma, junto ao ícone mariano “Salus Populi Romani”, onde tantas vezes rezou antes e depois de suas viagens apostólicas.

O tempo de “Sede vacante” traz à Igreja o chamado à oração e à confiança na condução do Espírito Santo. Jesus prometeu a Pedro: “Eu rezei por ti para que tua fé não desfaleça”. Muitos Pontífices passaram, mas a fé da Igreja permanece viva. Os cardeais brasileiros, incluindo o arcebispo do Rio de Janeiro, estarão em Roma para participar do velório e do conclave que elegerá o sucessor de Pedro. A Igreja segue em oração por ele e pela eleição do novo Pontífice.
Neste Ano Santo Jubilar, desejado pelo Papa Francisco como uma “peregrinação de esperança”, seguimos firmes, tendo-o como intercessor no céu. Continuamos sua missão de anunciar Jesus Cristo, nossa esperança, com fé e compromisso. Ele gastou sua vida servindo ao Reino de Deus, e sua partida nos impulsiona a viver com mais profundidade os valores do Evangelho que tanto anunciou e defendeu com a sua vida.

Unidos como Igreja, peregrinos de esperança, agradecemos pela vida e missão do Papa Francisco, e que ele repouse em paz. Confiamos que ele, agora na bem-aventurança eterna, reza por nós, pelo Rio de Janeiro, pela paz no mundo e pela continuidade de uma Igreja viva, misericordiosa e missionária.

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