Em entrevista ao Jornal Testemunho de Fé, conduzida pela agente da Pascom, Sabrina Miralha, o padre Adriano de Abreu Figueira — pároco e “filho” da Paróquia Cristo Operário e Santo Cura d’Ars, em Vila Kennedy, Zona Oeste do Rio — destacou a vocação especial de sua comunidade, descrita como um verdadeiro santuário espiritual no coração da cidade. Reconhecida como “berço das vocações”, a paróquia mantém a evangelização com foco nas vocações sacerdotais, religiosas e matrimoniais. Em agosto, durante o Mês Vocacional, celebrou com grande alegria seu copadroeiro, São João Maria Vianney, e encerrou as comemorações pelos 60 anos de fundação.
Como nasceu sua vocação sacerdotal?
— Como foi o início?
A minha vocação sacerdotal surgiu de um modo bem comum. Na verdade, nasci em uma família católica. Meu pai trabalhava muito, sempre foi comerciante e era aquele católico de algumas missas pontuais.
— E sua mãe, como era?
Minha mãe, desde muito jovem, foi muito envolvida com a Igreja. Era catequista, participava dos círculos bíblicos e de outras atividades, e sempre nos levava para as missas.
— E você? Gostava de frequentar a igreja?
Desde muito novo, eu sempre gostei de estar na igreja, no ambiente da catequese. Sempre me senti muito à vontade, muito em casa.
— Houve alguém que percebeu sua vocação?
Sim, o meu pároco da época, o padre José Carlos Lino de Souza, tinha uma visão sacerdotal. Ele sempre observava os jovens que tinham sinais de vocação, perguntava, motivava. Quando entrei na catequese, aos sete ou oito anos, ele já brincava que eu tinha sinais de vocação.
— E você, o que respondia?
Eu dizia que não, que não queria. Aí fui crescendo, adolescente, me envolvendo na igreja, fiz a Primeira Comunhão e me senti muito atraído pela dinâmica da fé e da Igreja.
— Durante a catequese, seus colegas gostavam tanto quanto você?
Não, enquanto os amigos às vezes reclamavam de ir para a catequese, eu gostava. Acordava cedo e já avisava minha mãe que estava pronto.
— O padre continuava insistindo na vocação?
Sim. Depois da Primeira Comunhão, ele continuou falando que eu tinha sinais de vocação, que precisava pensar nisso, discernir. Mas eu não queria muito.
— Você chegou a exercer funções na igreja?
Sim, fiz várias funções, menos uma: nunca fui coroinha. Achava que se subisse no altar com a veste, o padre diria que eu ia ser padre mesmo.
— Quais funções você exerceu?
Fui catequista de crianças e de perseverança, atuei em grupo jovem, grupo de artes da paróquia, e até coordenei uma das capelas.
— O padre continuava atento?
Sim, ele sempre me dava funções, missões, perguntava como estavam a vida, os estudos, o trabalho, o namoro, mas sempre dizia para eu pensar na questão vocacional.
— Ele insistia muito?
Sim, insistiu ao longo dos anos. Lembro de homilias sobre vocação em evangelhos, ele pregava muito bem, e minha percepção era que falava só para mim — embora fosse para toda a comunidade.
— Como você se sentia diante desse chamado?
Eu sentia muito medo. Pensava que podia ser algo meu, não de Deus, ou que não tinha as qualidades necessárias. Para mim, ser sacerdote era algo muito grande, distante.
— Sua paróquia tinha tradição vocacional?
Sim, a Paróquia Cristo Operário e Santo Cura d’Ars é vocacional, de onde saíram 14 sacerdotes e muitos foram para o seminário e depois discerniram outra vocação.
— Mesmo assim, você via o seminário como distante?
Muito distante, fora da minha realidade. Então fui protelando, evitando.
— Até que momento o padre parou de insistir?
Quando eu devia ter uns 18 anos, ele falou que não iria mais insistir, que Deus respeita a liberdade. Disse para eu focar nos estudos e no trabalho.
— O que você fazia nessa época?
Eu já trabalhava numa empresa no centro da cidade, na área administrativa, e começava o pré-vestibular e um projeto acadêmico também.
— E como foi depois?
Quando o padre parou de falar, comecei a ouvir com mais força a voz de Deus. Um amigo meu, que foi meu catequizando, o padre Fábio, e outro amigo, Anderson, foram para o GVA (Grupo Vocacional Arquidiocesano) para discernir a vocação no seminário.
— E você? Foi com eles?
Não tive coragem de ir, não admitia que tinha esse desejo. Ficava esperando eles voltarem do encontro para saber como tinha sido, com medo.
— Como foi seu processo de discernimento?
Ao longo do ano, fui rezando e percebendo que era bom. Eles chegavam entusiasmados e falavam sobre os encontros.
— Teve algum momento decisivo?
Sim, fiz um retiro de Carnaval na casa das Carmelitas Descalças Servas dos Pobres. Deus falou muito forte que eu precisava fazer o processo de discernimento.
— O que fez depois?
Procurei meu pároco e pedi uma carta para ir ao GVA. Ele riu, falou que já tinha me falado para ir, e que fosse com tranquilidade, sem contar para a comunidade.
— E como foi o GVA?
Durante o processo, Deus foi confirmando o chamado. No meio do ano, em um retiro vocacional em Itaipava, fiz uma dinâmica de oração com o padre Leandro Câmara, que era coordenador do GVA.
— O que sentiu nesse retiro?
Fui para o deserto, falei com Deus, e ficou claro que era o que Ele queria, e também o que eu queria. Foi a primeira vez que dei minha adesão ao chamado.
— E depois?
O GVA fluiu bem, fui convidado a ingressar no seminário. Dei esse passo com medo e dúvida, mas as dúvidas cessaram rapidamente.
— E sua caminhada desde então?
De lá para cá, Deus tem confirmado o chamado durante toda a formação. Já completei 10 anos de padre e estou muito feliz e realizado com a vocação que Deus me deu.
— O que essa vocação significa para você?
Ser pastor de almas, celebrar a Eucaristia, atender as confissões, levar o povo de Deus ao encontro com o Sagrado, com Cristo.
— Como você resume sua vocação?
Sem muitas situações extraordinárias, numa família católica, com uma mãe que me educou na fé, numa paróquia vocacional e ativa, Deus foi me chamando, me conquistando, e eu dei meu sim.
Quais sãos os desafios de sua missão?
— Como você enxerga os desafios da missão?
Eu entendo que para cada missão Deus concede a graça e a força necessárias para executá-la. Isso é fundamental.
— Quais missões você já exerceu?
Depois de ordenado, fui pároco da Paróquia Nossa Senhora da Conceição, no Guandu do Sena, por dois anos. Depois, fui reitor do Seminário Propedêutico Rainha dos Apóstolos, promotor vocacional da arquidiocese e responsável pelo grupo vocacional, por sete anos. Agora, retornei para a minha paróquia de origem, a Paróquia de Cristo Operário Santo Cura d’Ars, em Vila Kennedy, onde estou há um ano e cinco meses como pároco.
— Cada missão traz seus próprios desafios?
Sim, cada missão tem seus desafios e exigências. Mas muito mais forte que a dificuldade é a graça de Deus, é perceber a Providência que nos sustenta e nos dá direção.
— Que tipos de desafios enfrenta?
São muitos. Por exemplo, pregar e evangelizar num mundo que às vezes não quer escutar falar do amor de Deus e da exigência do Evangelho.
— E as pessoas, como reagem?
Às vezes não querem ouvir a vontade do Senhor, mudar de vida ou se converter.
— E na prática pastoral, quais desafios aparecem?
Hoje, muitas pessoas têm a vida muito corrida, com muitos compromissos.
— Houve alguma mudança na participação das pessoas?
Sim, na década de 1990, as pastorais eram muito cheias e participativas. Hoje, estão um pouco mais esvaziadas, mas o povo de Deus continua sedento, vindo às missas, bebendo da Palavra. Isso é um sinal de esperança.
— E os desafios da sociedade atual?
Lidar com os temas atuais que, às vezes, tentam adaptar ou facilitar o Evangelho. Nós precisamos ser fiéis à Palavra do Senhor.
— Existem desafios financeiros?
Sim, principalmente após a pandemia, quando muitas pessoas perderam emprego e renda. Sustentar uma comunidade paroquial e manter o templo tem custo.
— O padre cuida só das funções litúrgicas?
Não, o padre não só exerce as funções sacerdotais e celebrativas, mas também precisa administrar e cuidar do patrimônio do templo, o que é um grande desafio.
— A violência é um desafio na sua região?
Sim, o povo de Deus vive numa cidade como o Rio de Janeiro, num bairro como Vila Kennedy, onde precisamos estar sempre atentos.
— Por quê?
Porque volta e meia há possibilidade de assalto, troca de tiros, operações policiais. Precisamos dar suporte e estar atentos.
— Qual é a sua conclusão sobre esses desafios?
São muitos desafios, mas o maior é a graça de Deus que nos sustenta.
A Paróquia Cristo Operário e Santo Cura d’Ars é um berço vocacional?
— O que torna a paróquia um berço de vocações?
É importante reconhecer que a nossa paróquia, na Vila Kennedy, é um berço não só para vocações sacerdotais. Mas tivemos religiosas que saíram daqui, diáconos permanentes, leigos e leigas bem formados, conscientes do seu batismo, ativos na vida de fé e na sociedade.
— E as famílias?
Muitas famílias cristãs católicas belíssimas fazem parte da comunidade. Tudo isso é vocação, dom de Deus.
— Quantos padres já saíram daqui?
Se não me engano, a paróquia ainda é a que mais ofereceu vocações diocesanas: são 14 padres ordenados.
— Quantos deles ainda estão vivos?
Doze padres vivos foram ordenados aqui na Vila Kennedy; dois já faleceram.
— A quem você atribui esse número?
Em primeiro lugar, à atuação do nosso padroeiro, São João Maria Vianney, patrono dos sacerdotes.
— O que destaca nele?
Ele foi um pároco diocesano admirável, um homem doado à conversão e santificação do povo que lhe foi confiado. Com certeza, ele continua trabalhando muito aqui na paróquia.
— E quanto ao povo da comunidade?
Temos um povo que ora, que reza pelas vocações e apoia. É uma comunidade muito bonita, com uma fé autêntica.
— E o papel dos sacerdotes que passaram por aqui?
A atuação do sacerdócio na paróquia foi muito importante. De modo especial, destaco o padre Lino.
— Por que o padre Lino?
Porque os 14 padres ordenados saíram na época em que ele foi pároco aqui. Ele tinha um olhar atento para sinais de vocação, abordava e desafiava os jovens.
— Como ele fazia isso?
Muitas vezes trazia os jovens para perto para mostrar o que é a vida do padre. Nas homilias vocacionais, que eram muito fortes, não dava para ficar indiferente.
— Então esses fatores ajudaram a paróquia a ser vocacional?
Com certeza. Todos esses fatores fizeram da paróquia uma comunidade profundamente vocacional. E continuamos a ser assim.
— E o presente, como está?
Temos muitos jovens discernindo a vocação sacerdotal no momento, pensando em responder com alegria ao chamado do Senhor.
Como é a realidade pastoral da paróquia?
— Como você avalia a atuação dos Círculos Bíblicos na paróquia?
Os padres que passaram pela paróquia foram missionários e iniciaram o trabalho de evangelização. Os Círculos Bíblicos foram potencializados na época do padre Lino, mas ele já passou por muitas fases.
— E como está a paróquia hoje?
A paróquia continua sendo um diferencial por ser uma comunidade viva.
— Você pode dar exemplos?
Claro! Quando sugerimos uma missa campal, sempre tem um povo bom, reunido e disposto. Nas missões, nos terços pelas ruas, as pessoas participam.
— E em outras atividades?
Quando precisamos de voluntários para ir ao hospital para ajudar na higienização dos pacientes, fazer a barba ou cortar cabelo, sempre aparece pessoal para ajudar.
— E nas ações sociais?
Quando é necessário organizar uma coleta ou ajudar uma família, o pessoal se une rapidamente.
— E as missas?
As missas são sempre bem participadas. Uma característica da paróquia é que as pessoas cantam com muita alegria os cânticos da liturgia e das celebrações.
— A vocação ainda é forte?
Sim, a paróquia continua muito vocacional, com muitos jovens sentindo o chamado e pedindo direção espiritual.
— O trabalho pastoral tem te marcado?
Sim, porque sempre que sento para atender confissões, tem fila, sempre há gente esperando.
— Isso mostra algo sobre a comunidade?
Sim, a paróquia é muito voltada para a reconciliação com Deus e para o momento da orientação espiritual na confissão.
— Quais são os horários de confissão?
Temos vários horários: segunda-feira, a partir das 20h; quinta-feira, das 15h às 18h30; sexta-feira, às 9h; e quarta-feira, nas capelas em que celebramos por escala, sempre uma hora antes da missa. Além disso, há outros horários conforme a demanda.
— Que características você destacaria da paróquia?
É uma comunidade orante, que canta louvores ao Senhor e vive a reconciliação com frequência para estar em comunhão com Deus.
— E a estrutura física da paróquia?
Temos cinco capelas bonitas, vivas e atuantes no nosso bairro.
— Como você resumiria a paróquia?
Eu diria que é uma paróquia viva, atuante e feliz pela missão de ser Igreja.
Qual é o “coração” de sua pregação, do anúncio da Palavra de Deus, com base na sua experiência de vida e, de maneira especial, como pastor?
Uma mensagem de muita esperança.
— Por que essa mensagem é importante agora?
Porque estamos no começo do Mês Vocacional, um momento especial para nos inspirarmos na vida de São João Maria Vianney, um sacerdote admirável.
— Quais outras inspirações destaca?
Sou inspirado por tantos casais santos na vida da Igreja, tanto aqueles canonizados quanto os que conhecemos em nossas famílias e paróquias.
— E as mulheres na Igreja?
Sim, as religiosas que doaram e continuam a doar a vida na oração e na dedicação pelo bem da Igreja são uma grande inspiração.
— E os leigos e diáconos?
Também me inspiro nos diáconos, leigos e leigas fiéis no mundo, que são luzes, sal da terra e luz do mundo.
— Qual o convite para este Mês Vocacional?
Uma palavra de esperança para que possamos viver este mês redescobrindo nossa vocação à santidade, nossa vocação cristã, de sermos Igreja.
— Qual é a missão da Igreja, segundo você?
A Igreja deve redescobrir sempre sua missão de evangelizar, de levar o amor de Deus, o perdão do Senhor e ser no mundo um sinal desse amor de Deus que deu a vida para nossa salvação.
— Como você convida os fiéis a participarem?
Que todos os fiéis se unam em oração pelas vocações, mas também na ação: motivar, acolher e incentivar as vocações sacerdotais, religiosas e familiares na vida da Igreja.
— Uma bênção?
Que Deus abençoe a todos e nos conceda um mês vocacional feliz e fecundo para a vida da Igreja.
Sabrina Miralha
Agente da Pascom