Madre Maria Helena Cavalcanti

É com grande pesar que comunicamos o falecimento de Madre Maria Helena Cavalcanti, chamada carinhosamente de Mãezinha, fundadora da Congregação de Nossa Senhora de Belém, figura venerada e amada por todos que tiveram a honra de conhecê-la.

Nascida em 4 de junho de 1923, em Belém do Pará, ela foi a primeira filha do professor Djalma Cavalcanti e sua esposa, dona Conceição. Do Pará, a família veio para o Rio de Janeiro. O curso primário foi na Escola Alemã, onde o pai, professor, lecionava várias matérias. Até o final de sua vida, canções típicas do cancioneiro alemão fizeram parte do repertório cantado pela comunidade, fundada décadas mais tarde.

Sempre acompanhando o pai, as meninas seguiram para o Colégio Olavo Bilac, onde iniciaram o curso secundário. Madre Maria Helena, acometida, então, de forte asma, juntamente com sua irmã Sandra, terminou o curso secundário do Colégio Santa Maria, em Belo Horizonte. Ali, as duas irmãs Cavalcanti foram matriculadas no colégio, sob orientação das religiosas dominicanas, com as quais aprenderam a língua francesa. A jovem Conceição quis saber “se era obrigatório assistir às aulas de religião?” Compreensiva, a Irmã que a recebeu recomendou-lhe apenas: “Primeiro, você experimenta”. Mais tarde, a ex-aluna se lembraria da pergunta feita, “pagando com juros”, como ela mesma depois reconheceu, “dedicando a vida à evangelização da infância e da juventude”.

No final dos estudos em Belo Horizonte, recebeu o Prêmio de Excelência, bastante raro e só concedido a alunas com excelentes notas de aproveitamento nas diferentes matérias e também em comportamento.

De volta ao Rio, no início dos anos 40, optou por seguir o curso de História e Geografia, na Faculdade Católica recentemente fundada pelo jesuíta padre Leonel Franca, atual Colégio Santo Inácio, em Botafogo. Com o escritor Alceu Amoroso Lima, que ajudara o padre na fundação do novo centro universitário, Conceição seguiu o curso de Literatura, atribuindo a um dos trabalhos da aluna “o reconhecimento de um talento de verdadeira escritora”.

Enquanto isso, o crescimento interior silencioso continuava superando as fortes crises de asma e enxaquecas. Além das obrigações de estudante, passou a dar aulas de religião na escola pública, próxima à casa de sua família. Pedia a proteção do Espírito Santo e da Virgem Maria, para que falasse, por seu intermédio, aos alunos: “Não a nós, Senhor, mas ao Vosso Nome, dai Glória, para que os meninos Vos conheçam e Vos amem”.

Desde jovem, Madre Maria Helena demonstrou profunda devoção religiosa e um compromisso inabalável com a educação e a evangelização. Aos 24 anos, ingressou como postulante na Congregação Dominicana em Belo Horizonte, onde recebeu o nome religioso de Irmã Maria Helena do Sagrado Coração.

Madre Maria Helena também desenvolveu fecundo trabalho apostólico com as alunas missionárias. Em Poços de Caldas, em 1955, iniciou o trabalho de ‘alunas missionárias’, incentivando as jovens alunas do Colégio São Domingos a trabalharem seriamente no seu aperfeiçoamento religioso, moral e intelectual, de modo a poderem atuar através do ensino de religião. Ela acreditava que “as coisas belas e boas sempre foram ditas, mas cada época varia seu modo de dizê-las. Devemos aproveitar as conquistas da técnica para a transmissão e a divulgação do bem”.

Seu talento literário, já reconhecido pelo antigo professor, se expressou em diversos momentos na peça teatral “Maria da Graça e os Sete Dons”, uma catequese sobre a força do Espírito Santo. Também adaptou a comédia “O Doente Imaginário”, de Molière, representada com sucesso no teatro da cidade por alunas do Colégio São Domingos. Nessa ocasião, escreveu belos poemas, como “Nossa Senhora do Belo Olhar”, “Viver de Esperança” e tantos outros que nos levam ainda hoje a uma sintonia com nosso Deus. Na revista “Alunas Missionárias” orientava:

“Uma aluna missionária é aquela que trabalha seriamente no seu aperfeiçoamento religioso, moral e intelectual, de modo a poder atuar. E pela sua presença e ação, especialmente através do ensino de religião”.

Mais adiante, ela completou seu pensamento de adequação à mudança dos novos tempos:

“As coisas belas e boas sempre foram ditas, mas cada época varia seu modo de dizê-las. Devemos aproveitar as conquistas da técnica para a transmissão e a divulgação do bem”.

Finalmente, em abril de 1953, há 72 anos, a preocupação com o ensino religioso retornou muito forte. Como disse, “parecia uma inspiração do alto e uma respiração da realidade”. “Uma das últimas sementes de São Domingos deve ser plantada no asfalto: a ideia de irmãs ensinantes em escolas leigas. Seria bom que alguém a realizasse”. E acrescentou: “é principalmente na juventude das escolas leigas que se forma o Brasil de amanhã. A maioria de nossas crianças e jovens vão para as escolas públicas, onde o ensino é gratuito e a vida está difícil, mesmo para a classe média”.

Aos poucos e apesar de toda sua fragilidade, Irmã Maria Helena foi tomando consciência de que Deus a chamava para essa missão única e urgente. Mas como realizá-la, onde e com quem?

Em 4 de janeiro de 1954, Irmã Maria Helena escrevia essas palavras, cujo sentido ainda não compreendia plenamente: “Está chegando, luz da Epifania, luz da Fé. Só uma estrela te guiará e terás de me buscar no estábulo. A Estrela vai dar lá”.

Mas o tempo de Deus não é o nosso. Quase três anos se passaram, e em 1957, Irmã Maria Helena foi transferida para o Centro Social Feminino, na Rua Real Grandeza, em Botafogo, no Rio de Janeiro. Ali, com licença da superiora e depois de ter se apresentado ao monsenhor Álvaro Negromonte, encarregado da catequese, iniciou um trabalho diferente do que fazia entre as dominicanas: a evangelização nas escolas públicas. Antes de sair para a primeira aula, invocou aqu’Ele a quem deveria anunciar. Abriu a Bíblia e seu dedo repousou sobre um versículo: “O Senhor é minha Luz e minha Salvação. A quem temerei?” Suas primeiras palavras às alunas se basearam em um provérbio chinês: “‘As palavras de um amigo aquecem por três invernos’, trago-lhes as palavras do Maior dos Amigos, brasas ardentes para todos os invernos…”.

“Depois de quase dois anos de experiência nas escolas, no dia 20 de abril de 1958, escreveu um relatório ao senhor Cardeal Dom Jaime de Barros Câmara. Sua Eminência leu-o atentamente, segundo suas próprias palavras, e telefonou à Irmã Maria Helena, chamando-a ao Sumaré para uma conversa. Era começo de maio.

Pela primeira vez conta que se viu diante de um cardeal: “Logo percebi que estava conversando com um varão de Deus, na plena acepção da palavra. Sabia ouvir tão bem, com tanta educação, calor humano e simplicidade, que fui me abrindo e dizendo muito mais do que escrevera. Nós nos encontramos no Espírito Santo. Disse-me que minha preocupação vinha ao encontro de uma grande preocupação sua: a catequese”.

“Creio que, mesmo com um frade dominicano e amigo, eu não teria tido um clima de confiança tão propício à criatividade como gozei nos doze anos de colaboração com Dom Jaime.”

“A lealdade recíproca e o respeito mútuo jamais se desmentiram.”

“Uma fundação é ninho de inúmeras e variadas cruzes, conhecidas e desconhecidas, mas uma me foi poupada: a da incompreensão de meu chefe. Sentia-me aceita e carregava o fardo suave e pesado de sua confiança, que obriga muito mais do que o temor.”

“Ao sair do Sumaré, uma nova estrada se abria.”

A 20 de maio de 1958, tudo estava preparado, mas faltava um nome para a obra. Irmã Maria Helena abriu a Bíblia e seu dedo caiu sobre a palavra ‘Belém’. Imediatamente pensou: mas pelas mãos de Maria, Nossa Senhora de Belém. Aí está resumido todo o carisma: prolongar o mistério da Encarnação no meio estudantil laicizado pelas mãos de Maria, levando uma vida de pobreza, humildade, alegria em uma casa aberta a pastores e reis, como a Gruta de Belém. Belém, a “Casa do Pão”, da Eucaristia, da sã doutrina.

Dia 22 de julho de 1958, Festa de Santa Maria Madalena, “A apóstola dos apóstolos”, a nova comunidade iniciou sua vida. Além da Irmã Maria Helena, acompanhavam-na três alunas e uma filha de Maria para auxiliar nos trabalhos da casa.

 

Atualmente são nove casas:

* Jacarepaguá – Casa Mãe e casa de formação

* Porto das Caixas, município de Itaboraí e Arquidiocese de Niterói

* Soledade, município de Sumidouro e Diocese de Nova Friburgo

* Lagoa Santa (MG), na Arquidiocese de Belo Horizonte

* Samambaia, região administrativa do Distrito Federal, na Arquidiocese de Brasília

* Anápolis, em Goiás, na diocese do mesmo nome

* Petrópolis, na diocese do mesmo nome

* Natal (RN), Arquidiocese de Natal

* Caicó (RN), Diocese de Caicó

 

Conhecida pela força de sua pregação, sua espiritualidade, amor à Igreja e generoso serviço pela causa do Reino, ao longo de sua vida, Madre Maria Helena recebeu inúmeros elogios por sua sabedoria, empatia e capacidade de tocar os corações de todos ao seu redor. Suas cartas e ensinamentos inspiraram muitos, e sua presença era uma fonte constante de conforto e orientação.

Ao longo desses 101 anos de vida de Madre Maria Helena Cavalcanti, as graças divinas foram abundantes e também as cruzes não faltaram, como é o caminho de todo amigo de Jesus, nosso Redentor. Ela deixa um legado duradouro de fé, amor e dedicação ao serviço de Deus e da comunidade. Sua vida foi um testemunho vivo do poder transformador da fé e do amor ao próximo.

Que sua alma descanse em paz, e que seu exemplo continue a inspirar gerações futuras. “Viver de esperança, não é viver esperando, é possuir desejando…” (Madre Maria Helena Cavalcanti).

 

 

Irmã Graça Maria, CNSB

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