Monsenhor Gilson no abraço do Pai
A missão cumprida de um pastor humilde
Com fé e esperança cristã, comunicamos a Páscoa de Monsenhor Gilson José Macedo da Silveira, ocorrida na manhã desta segunda-feira, 1º de setembro de 2025, que partiu para o abraço do Deus da Vida, Criador do Céu e da Terra, com a serenidade de quem viveu intensamente o Evangelho.
Na liturgia de hoje, recordamos as palavras do apóstolo Paulo — proclamadas na primeira leitura — como consolo e testemunho da fé que sustentou sua caminhada: “Se Jesus morreu e ressuscitou — e esta é nossa fé —, de modo semelhante Deus trará de volta, com Cristo, os que, através dele, entraram no sono da morte. […] Ressuscitarão primeiro […] e estarão sempre com o Senhor” (1Ts 4,14.16-17).
A Igreja no Rio de Janeiro rende graças a Deus pela vida e missão de monsenhor Gilson, que, ao longo de 68 anos de ministério e aos 92 anos de idade, deixou um profundo legado de serviço, humildade e amor à Igreja.
Pastor humilde, mestre generoso, amigo fiel
Homem de grande cultura, inteligência brilhante e visão atualizada da sociedade, monsenhor Gilson jamais se afastou da simplicidade e da humildade, virtudes que marcaram cada gesto de sua vida sacerdotal. Bastava ver seu quarto em sua Paróquia e sua simplicidade no dia a dia. Mesmo com toda sua intelectualidade, sua principal pregação foi sempre a própria vida, espelho do serviço por amor a Deus e ao próximo.
Discreto sobre si mesmo, preferia gastar palavras para falar de quem mais amava: Jesus Cristo. E isso transparecia não apenas em suas homilias e ensinamentos, mas, sobretudo, no testemunho de vida. Diversas pessoas que com ele conviveram descrevem-no como um verdadeiro amigo e irmão, sempre presente com uma palavra oportuna, um gesto acolhedor ou um silêncio cheio de sabedoria. Testemunham seu tempo nas paróquias e sua missão como vigário episcopal.
Era um homem cuja presença inspirava confiança e paz. Mesmo diante das dificuldades, surgia com a calma de sempre, transmitindo força e coragem aos que o rodeavam. Para muitos, ele foi e continuará sendo a figura viva de Cristo: bondoso, transparente, firme e profundamente comprometido com o Evangelho. Eu confiei a ele a missão de visitar e ajudar os padres.
Pastor sensível e próximo do povo, monsenhor Gilson se dedicou a fortalecer pastorais, movimentos e diversos espaços de evangelização.
Sempre disposto a ouvir, buscava a opinião dos outros não por formalidade, mas por acreditar verdadeiramente no diálogo e na construção fraterna das soluções — mesmo nos momentos mais difíceis.
Sua atuação firme e serena foi referência para o clero, especialmente na formação dos futuros sacerdotes. Como educador e guia espiritual, soube ensinar não apenas os fundamentos da fé, mas também valores humanos e sociais, ajudando muitos a viverem com mais dignidade, esperança e compromisso cristão.
Mais do que um mestre, foi pastor da simplicidade. Com humildade própria das grandes inteligências, dedicou-se com zelo às mais diversas missões confiadas a ele, sempre movido pela caridade pastoral. Sua presença nas comunidades, encontros e decisões era sinal concreto da ação de Cristo Bom Pastor.
Agradecemos a Deus por tudo o que monsenhor Gilson fez pela nossa Arquidiocese: pela formação do clero, pelo incentivo constante à evangelização, pela organização pastoral e, sobretudo, por sua presença humilde e serena nas horas mais difíceis. Sua vida é uma bênção e uma honra para a Igreja do Rio de Janeiro.
Formação acadêmica
Natural do Rio de Janeiro, nascido no bairro de Botafogo em 11 de abril de 1933, monsenhor Gilson José Macedo da Silveira foi filho de Nemésio Silveira e Angélica Macedo Silveira. Desde criança, sentiu o chamado ao sacerdócio e ingressou, aos 12 anos, no Seminário Arquidiocesano de São José, em 1945, onde concluiu os estudos fundamentais e médios até 1950.
Dando continuidade à formação, cursou Filosofia no Seminário Maior entre 1951 a 1953. No mesmo ano, seguiu para Roma, onde estudou Teologia na Pontifícia Universidade Gregoriana. Lá, recebeu o diaconato em 28 de outubro de 1956 e, meses depois, foi ordenado presbítero pelo Cardeal Luigi Traglia, na Basílica dos Santos Doze Apóstolos, no dia 17 de fevereiro de 1957.
Além dos estudos teológicos, buscou formação em outras áreas. Cursou Relações Humanas no Instituto Superior de Relações Humanas e Jornalismo na Università Internazionale degli Studi Sociali, também em Roma. Tornou-se doutor em Teologia Sistemática com a tese “Experiência e conhecimento de Deus em M.T.L. Penido”, e publicou diversas obras, como “Seminário Hoje”, “Diáconos Casados”, “O conhecimento de Deus e sua experiência”, “Teodiceia e Analogia”. Poliglota, dominava várias línguas: italiano, francês, inglês, espanhol, latim e grego bíblico.
Um educador apaixonado pelo Seminário
De volta ao Brasil em 1959, Padre Gilson passou a atuar no Seminário de São José como professor e, posteriormente, como vice-reitor. Em 1974, assumiu a reitoria, cargo no qual se destacou por sua inteligência, sensibilidade pastoral e capacidade de liderança.
Seu trabalho como formador foi fundamental em um tempo de grandes mudanças na Igreja, especialmente durante e após o Concílio Vaticano. Soube conduzir o Seminário com equilíbrio e fidelidade às orientações da Igreja, promovendo a vida comunitária e o amadurecimento vocacional. Era um reitor presente, atento aos seminaristas e eloquente ao aplicar a Palavra de Deus à vida concreta.
Por sua dedicação, recebeu em 10 de julho de 1963 o título de cônego honorário do Cabido Metropolitano, concedido por Dom Jaime Câmara. Anos depois, em 30 de dezembro de 1967, foi nomeado Camareiro Secreto de Sua Santidade pelo Papa São Paulo VI, recebendo o título de Monsenhor.
Professor, pastor e servidor da Igreja
Monsenhor Gilson acumulou vasta experiência como professor, lecionando Teologia na PUC-Rio (1968–1981) e Filosofia na Universidade Santa Úrsula (1969–1971). Exerceu também com zelo o ministério de capelão junto às Irmãs Paulinas (1959–1968), às Pias Discípulas do Divino Mestre (1969–1971) e à Comunidade do Morro da Formiga, na Tijuca (1963–1971 e 1974–1979).
Com espírito pastoral e sensibilidade social, foi assistente das pastorais do Trabalhador e das Favelas entre 1964 e 1970, membro do Conselho Presbiteral em diversos mandatos e coordenador da assistência espiritual aos presbíteros. Atuou como vigário episcopal do Vicariato Suburbano em vários mandatos (1979, 1998, 2001 e 2004), vigário episcopal interino do Vicariato Oeste (1980) e membro da Comissão para o Diaconato Permanente (a partir de 1985). Eu recordo a insistência dele em deixar o cargo de vigário episcopal depois de tantos mandatos para se “dedicar mais amplamente à Paróquia para visitar as casas, os enfermos, atender as pessoas”.
No serviço paroquial, monsenhor Gilson também deixou marcas profundas. Foi pró-pároco e vigário ecônomo em diversas comunidades, passando pelas paróquias Nossa Senhora do Amparo e Santa Maria Goretti (1978), Santa Teresa de Jesus (1979), São José de Realengo (1981), São Jerônimo em Coelho Neto (1981–1982), Nossa Senhora da Saúde em Curicica (1989) e São Mateus em Oswaldo Cruz (1993).
Três décadas à frente da Paróquia São João Evangelista
Foi na Paróquia São João Evangelista, em Oswaldo Cruz, que monsenhor Gilson exerceu seu mais longo e frutuoso pastoreio. Assumiu a paróquia em 3 de junho de 1988 e nela permaneceu por 32 anos. Com o coração de pastor e a sabedoria de mestre, fortaleceu pastorais, incentivou os movimentos e promoveu um espírito de partilha e comunidade.
Ao completar 87 anos, e já enfermo, em 2020, pediu a renúncia do ofício e passou a residir por opção na Casa do Padre que sempre elogiava e agradecia, mantendo-se ativo na coordenação da assistência espiritual aos presbíteros da Arquidiocese do Rio de Janeiro.
Gratidão pela vida e missão
Monsenhor Gilson foi um grande colaborador da Igreja e um sacerdote admirado por seus irmãos no ministério. Agradecer a Deus por sua vida e missão é um gesto de gratidão que envolve toda a Arquidiocese do Rio de Janeiro. Reconhecemos, com profundo respeito, os dons que o Senhor lhe concedeu ao longo de tantos anos de serviço fiel.
Sua trajetória nos faz recordar a beleza da vocação sacerdotal. O padre é dom para o povo de Deus: é presença do amor divino que se torna visível por meio de gestos, palavras e atitudes. Escolhido entre os homens, o sacerdote é chamado a servir, a cuidar, a conduzir e a sustentar o povo na fé, sendo sinal do Cristo Bom Pastor em meio ao rebanho.
Monsenhor Gilson viveu esse chamado com generosidade e entrega. Sustentado por uma vida de oração e busca constante da santidade, levado pela espiritualidade de Charles de Foucould, foi verdadeiro facilitador do encontro pessoal com Cristo. Antes de qualquer tarefa, colocou o coração a serviço, com humildade e sabedoria, tornando fecundo o seu ministério sacerdotal.
Em nossa arquidiocese, temos a alegria de contar com muitos padres que se doaram – e continuam a se doar – pelo Reino de Deus. Hoje, agradecemos de modo especial pela vida e vocação de monsenhor Gilson. Louvamos a Deus por tudo o que ele realizou: na formação do clero, no incentivo à evangelização, na organização pastoral e, especialmente, por sua presença serena e humilde nos momentos difíceis.
Neste primeiro dia de setembro à tarde – segunda-feira –, por volta das 17h, seu corpo chegará à Igreja Matriz da Paróquia São João Evangelista, em Osvaldo Cruz quando se iniciarão as missas a cada hora e meia presidida e concelebrada pelos sacerdotes gratos a Deus pela vida e missão desse grande homem de Deus.
As celebrações continuarão amanhã, terça-feira, dia 2 de setembro quando a 1ª Carta de São Paulo aos Tessalonicenses nos fala de Jesus Cristo que “morreu por nós para que, quer vigiando nesta vida, quer adormecidos na morte, alcancemos a vida junto dele. (1Tes 5, 10). Nesta terça feira, celebraremos a missa de exéquias na Paróquia São João Evangelista de Osvaldo Cruz às 14h e de lá iremos para a Quadra da Irmandade São Pedro, no Cemitério São Francisco Xavier no Caju, onde ele será sepultado junto com tantos sacerdotes que serviram a esta Igreja Arquidiocesana à espera da Ressurreição final.
Aos familiares, aos antigos paroquianos, aos amigos e a todos que choram a partida de nosso grande irmão o nosso abraço fraterno e unidade na certeza da vida que não termina com a morte.
Que Deus o acolha em sua glória, e que ele possa contemplar eternamente Aquele a quem amou, serviu e anunciou com tanto fervor. Que a luz perpétua o ilumine. Descanse em paz nos braços do Senhor caríssimo amigo e irmão, Mons. Gilson.
Dom Orani João, Cardeal Tempesta. O. Cist. Arcebispo de São Sebastião do Rio de Janeiro, RJ