Pier Giorgio Frassati: Um cidadão do alto

“Buscai as coisas do alto, onde está Cristo sentado à direita de Deus” (Cl 3,1). Decerto que, ao dirigir-se aos colossenses com essas palavras, São Paulo os exortava ao desprendimento das realidades passageiras deste mundo, para que dedicassem as suas vidas às realidades eternas. Entretanto, literalmente falando, as Sagradas Escrituras costumam associar os lugares altos ao encontro com Deus. Moisés e Elias experimentaram grandes teofanias sobre montes; o próprio Senhor Jesus subia à montanha para rezar.

Para um certo jovem italiano, de família rica, do início do século XX, subir montanhas era o passatempo predileto. Poderia ser somente mais um hobby de um moço frívolo, se este não fosse o único filho homem de Alfredo Frassati, fundador do jornal La Stampa e embaixador da Itália em Berlim. O jovem em questão chama-se Pier Giorgio Frassati, e será um dos primeiros santos canonizados pelo Papa Leão XIV, juntamente com Carlo Acutis, neste domingo. Mas a pergunta que resta é: o que Pier Giorgio fez para ser elevado à glória dos altares?

Nascido em 1901 no seio de uma família relevante de Turim, Frassati cresceu com condições materialmente favoráveis, mas espiritualmente frágeis. Não tinha o exemplo de seus pais em casa. Sua mãe, Adelaide, artista plástica, conservava uma fé católica de tradição familiar, mas sem comprometimento. Seu pai, Alfredo, dizia-se agnóstico. Pier Giorgio progrediu em piedade influenciado, sobretudo, pelo exemplo de sua avó.

Desde criança começou a mostrar traços de uma generosa sensibilidade para com os mais necessitados. Tal sensibilidade e piedade não demoraram a se unir à sua educação rígida, ao seu caráter reto e à sua personalidade forte. Aos dezessete anos inscreveu-se na conferência vicentina e passou a desempenhar apaixonadamente o serviço aos pobres e doentes. Ainda adolescente dava sinais claros de que não seguiria o mesmo caminho dos rapazes da sua idade e com sua condição financeira, os quais abandonavam a prática da religião ao completarem os sacramentos da Iniciação Cristã. Pier Giorgio assumia que não fora feito para coisas baixas, mas para as coisas do alto!

Sua intensidade era marcante em tudo o que fazia, não somente no serviço aos pobres. Quando Frassati se dedicava a algo, ele o fazia por inteiro. Isso vemos também em suas amizades, que, em primeiro lugar, eram pautadas por seu amor a Cristo, depois por uma sincera preocupação com o próximo e, enfim, por um fascinante senso de humor. Era intenso, sobretudo, na virtude da caridade. As palavras do Apóstolo “O amor de Cristo nos impele” (2Cor 5,14) cabem bem para dizer sobre este combustível que movia Pier Giorgio a doar-se pelo próximo. Uma entrega tal que perpassava as paredes de casa, da igreja e os limites de suas amizades e chegava até a política. Foi um grande defensor da Doutrina Social da Igreja frente às ideologias mundanas que marcaram a primeira metade do século XX, sobretudo o fascismo.

Faz-se necessário recordar enfaticamente: Frassati sabia-se um cidadão do alto. Não se envolvia em política para o triunfo de estratagemas humanos, mas em prol da expansão do Reino de Deus e da defesa dos valores cristãos frente a uma sociedade cada vez mais descristianizada. Vale ressaltar que ele viveu no entreguerras, quando os projetos ideológicos totalitários se fortaleciam e preparavam o início da devastadora 2ª Guerra Mundial.

Quando subia as montanhas, porém, apesar de todo esforço empenhado na caminhada e na escalada, parecia tomar fôlego para lutar pelos interesses de Cristo com todas as suas forças. Ali achava um refúgio e, sobretudo, um encontro: “Quanto mais alto nós formos, melhor nós ouviremos a voz de Cristo”, e, de fato, subia os mais altos montes da Itália.

Como todos os santos, Frassati teve também de passar pelo seu Monte Calvário. Percebeu-se apaixonado pela jovem Laura Hidalgo, o que certamente o desestabilizou. Era a moça dos seus sonhos. Pier sabia que, se decidisse casar-se com ela, seus pais se oporiam veementemente. Isto porque Laura era de origem muito mais simples que a dele. Frassati decide abrir mão de Laura para salvaguardar o casamento dos pais, que estava beirando a separação.

No Ano Santo de 1925, convocado pelo Papa Pio XI, Pier Giorgio estava em plena subida em sua vida espiritual: dedicava-se à leitura das cartas paulinas e dos escritos de Santo Agostinho. Apesar das lutas interiores, Frassati continuava a doar-se vigorosamente aos mais pobres. Foi então que contraiu uma poliomielite fulminante, que se agravou rapidamente. Em questão de dias, o estado já era terminal. Suas últimas palavras foram escritas num papel. E ali, naquele momento derradeiro, Frassati deu um último testemunho de sua ardente caridade. Era quinta-feira, dia em que os vicentinos se reuniam para visitar os pobres. Pier Giorgio escreveu em letras garranchadas, de quem estava sofrendo muito, um pedido para que fossem entregues a uma das pessoas assistidas as ampolas farmacêuticas que ele deveria entregar. Assim, no dia quatro de julho daquele ano, subiu a mais alta das montanhas e entregou sua alma a Deus.

No seu cortejo, as ruas de Turim estavam lotadas: eram, sim, os familiares e os amigos de Frassati, mas, muito mais, eram os pobres e enfermos auxiliados por ele que prestavam uma homenagem póstuma àquele que São João Paulo II chamaria mais tarde de “Homem das oito bem-aventuranças”.

Assim, pode-se responder à pergunta supracitada: Pier Giorgio Frassati subirá à glória dos altares porque não cessou de subir as mais altas montanhas do amor de Deus quando passou por este mundo. Deixou-nos, ainda, a nós que ainda estamos nessa “escalada” em direção à Pátria, um incentivo escrito em sua última fotografia nas montanhas: “Verso l’alto!”, “Rumo ao alto!”

 

Rennan Nazar

 

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