13 de setembro 24º Domingo do Tempo Comum

Eclo 27,33 – 28,9

Sl 102

Rm 14,7-9

Mt 18,21-35

“O Senhor é bondoso e compassivo”

Cada domingo, na liturgia da Palavra, o próprio Cristo vem ao nosso encontro e nos dirige pessoalmente a sua Palavra. Assim como nos alimentamos do seu corpo e sangue, também nos alimentamos da sua Palavra, que é verdadeiramente um “pão” descido do céu para nós (cf. Dt 8,3; Mt 4,4).

Os textos proclamados na liturgia da Palavra deste domingo nos falam, sobretudo, do perdão. A primeira leitura começa com uma sentença do livro do Eclesiástico: O rancor e a raiva são coisas detestáveis; até o pecador procura dominá-las. A partir dessa sentença, o autor sagrado segue exortando seus leitores a perdoarem o próximo, a fim de encontrarem, também, perdão da parte de Deus. Nas palavras do Eclesiástico ouvimos um eco de Lv 19,18-17: “Não terás no teu coração ódio pelo teu irmão. (…) Não te vingarás e não guardarás rancor contra os filhos do teu povo. Amarás o teu próximo como a ti mesmo. Eu sou o Senhor.”

No centro desse trecho do Eclesiástico, ouvimos um chamado à compaixão: Se não tem compaixão do seu semelhante, como poderá pedir perdão dos seus pecados? (Eclo 28,4). O termo aqui traduzido como compaixão é o termo grego éleos. Este termo traduz, na Bíblia Hebraica, o termo hésed, que pode significar “amor, bondade, graça, misericórdia”. A Escritura louva a Deus porque ele tem hesed, ou seja, no seu “amor” ele se dobra sobre os homens e tem deles “compaixão” (rahamîm – outro termo que aparece unido, nas Escrituras, ao termo hesed). A partir da contemplação desse amor de Deus e, mais ainda, da própria experiência do amor de Deus, o homem também deve “amar o seu próximo”, como ouvimos acima no texto do Levítico. Esse amor se manifesta, concretamente, na capacidade de perdoar. Assim como o perdão divino é a mais forte experiência do seu amor por nós, também devemos manifestar concretamente nosso “amor” (hesed, éleos) ao próximo por meio de um sincero perdão.

O salmista canta, no salmo responsorial deste domingo, essa bondade, esse amor infinito de Deus, relacionando com o perdão dos pecados: Pois ele te perdoa toda culpa… e te cerca de carinho (hésed) e compaixão (rahamîn) (cf. Sl 102,3-4).

O Evangelho está estreitamente unido à primeira leitura, como é próprio da organização do lecionário dominical no Tempo Comum. A pergunta de Pedro dá ensejo ao ensinamento de Jesus a respeito do perdão dos pecados. Pedro quer saber se deve perdoar o irmão que o ofende até “sete vezes” e Jesus amplia o horizonte de Pedro: Não te digo até sete vezes, mas até setenta vezes sete. Em outras palavras, infinitamente. Pedro e todos nós, que ouvimos a Palavra de Jesus dirigida a ele, devemos perdoar infinitamente. A motivação vem ilustrada na forma de uma parábola: Deus nos perdoa sempre; perdoou-nos uma dívida imensa; eis o motivo pelo qual devemos, também nós, perdoar aqueles que nos fazem o mal.

Na parábola, um rei resolve acertar contas com seu empregado que lhe deve uma fortuna enorme: 10.000 talentos. Embora o talento pudesse variar, afirma-se que um talento valia de 6 a 10 mil denários. Logo em seguida, vemos o que este empregado vai fazer com alguém que, diante da sua dívida, lhe deve uma quantia irrisória (100 denários).

O empregado, que devia uma enorme fortuna, devia ser vendido como escravo, junto com sua família, a fim de pagar sua dívida. Contudo, ele suplica, prostra-se diante do rei e pede que o rei seja “paciente” com ele. Mais que um prazo, o servo apela para a bondade, para o amor do seu superior. Em grego, o termo é makrothymia, que significa um “coração dilatado”. A Escritura diz que o rei teve “compaixão”, que ele ouviu a suplica do servo, que ele dilatou seu coração diante daquele homem que lhe implorava. Aqui Mateus utiliza um verbo grego muito particular para indicar a “compaixão” desse rei: o verbo splanknidzomai. Tal verbo se conecta à raiz do termo splanka que, traduzido, significa “entranhas”. Algo se move no interior desse rei. Ele não fica indiferente ao sofrimento do seu servo. O texto diz que ele não deu um “prazo”, mas “perdoou a dívida”, uma dívida enorme, quase que impagável para aquele servo.

Esse mesmo servo encontra, logo em seguida, um dos seus “companheiros”, um igual, que lhe deve apenas cem denários (cem moedas). O denário era a diária de um trabalhador comum. Valia em torno de meio quilo de pão, ou seja, aquilo o que um homem precisava para sustentar cada dia sua família. O servo, que acabara de ser perdoado pelo seu rei, não quis saber: agarrou seu companheiro e começou a sufocá-lo. Esse homem faz o mesmo gesto e repete as mesmas palavras que o servo havia proferido diante do seu rei. O servo, contudo, que recebeu compaixão do seu superior, não soube ter compaixão do seu próximo. O que teve uma grande dívida perdoada, não soube perdoar a pequena dívida do seu irmão.

A parábola termina com o rei/patrão tomando conhecimento de tal injustiça. Imediatamente ele chama o servo e o manda para os torturadores, porque não foi capaz de partilhar com o próximo a mesma compaixão recebida. Jesus conclui seu ensinamento com uma advertência: É assim que o meu Pai que está nos céus fará convosco, se cada um não perdoar de coração ao seu irmão (cf. Mt 18,35).

A advertência de Jesus é forte e nos faz refletir. Deus espera que tenhamos com o nosso próximo a mesma atitude que Ele tem para conosco. Deus nos perdoa sempre, como diz o salmista: Nunca nos trata conforme nossos erros, nem nos devolve segundo nossas culpas (Sl 102[103],10). Do mesmo modo, ele espera que sejamos capazes, também, de agir com misericórdia, perdoando o outro que nos feriu. Sabemos que não é fácil. O caminho da raiva, do ódio, da vingança, parece muito mais atrativo. Contudo, esse não foi o caminho que o Senhor que nos ensinou, nem o caminho que ele próprio trilhou, uma vez que, do alto da cruz, perdoou seus algozes (cf. Lc 23,34). O perdão não somente constrói a paz, como também nos beneficia espiritual e mentalmente. Peçamos ao Espírito Santo do Senhor que nos ajude a trilhar o caminho do perdão, do amor e da misericórdia, segundo a vontade daquele que morreu e ressuscitou a fim de nos abrir as portas da salvação e da vida eterna.

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