A espiritualidade ecológica em Santo Inácio de Loyola

No dia 31 de julho, celebramos a memória de Santo Inácio de Loyola, fundador da Companhia de Jesus, em 1540, ordem religiosa dos jesuítas.

A chamada espiritualidade ecológica inaciana é fundamentada nos Exercícios Espirituais, na autobiografia do santo e nos documentos mais recentes dos jesuítas. Na contemplação para alcançar amor (Ad Morem) dos Exercícios Espirituais, vamos encontrar uma dimensão mais cosmocêntrica entre Deus Criador, seres humanos e toda a Criação, constituindo assim uma síntese entre o teológico, o antropológico e o ecológico. Santo Inácio propõe alguns pontos para a contemplação entre o Criador e as criaturas, para que possamos experimentar a grandeza do amor divino que se prolonga na particularidade de todas as coisas criadas sobre a face da Terra.

Um primeiro ponto consiste em trazer à memória os benefícios recebidos da Criação (EE.234), pois ela tem um significado biológico, antropológico e teológico. Trazer à memória é reconhecer a dimensão divina do mundo criado; é pensar, louvar e agradecer a Deus toda a história viva do planeta onde habitamos; é reconhecer a beleza e a particularidade de cada ser criado, com suas diferenças e detalhes; é entender que toda a Criação procede do mesmo Pai Criador; é admirar a beleza da natureza que nos circunda; é recordar que não somos donos e proprietários da Criação, mas meros zeladores, administradores e guardiões da grandeza da natureza; é reconhecer que em cada ser vivo se manifesta o amor e a glória do Criador.

Um segundo ponto é considerar como Deus habita nas criaturas, nos elementos, dando-lhes o ser, nas plantas vegetando, nos animais o sentir e nos homens o entender pela inteligência (EE.235). Com um olhar místico, reconhecemos a presença de Deus na natureza, sendo ela uma manifestação do grande amor divino que se manifesta na singularidade e pluralidade das formas de vida que compõem o pluriverso planetário. O entender humano passa agora pela dimensão teológica, na qual é possível ver Deus em tudo e em todos.

Um terceiro ponto é considerar como Deus age e trabalha por mim em todas as coisas criadas sobre a terra: nos céus, nos elementos, nas plantas, nos frutos, nos animais etc. (EE.236). Embebidos desse olhar de amor e gratidão seremos capazes de ver o agir e o trabalho de Deus por mim em todas as coisas criadas, onde todos os bens e dons descem do alto, como do sol provêm os raios e as águas de sua fonte.

Na sua autobiografia, merece destaque dois fatos que revelam a sensibilidade ecológica na vida de Santo Inácio. O primeiro era a sua consolação quando olhava o céu e as estrelas, pois fazia muitas vezes e por muito tempo, porque com isso sentia em si um maior esforço e desejo de servir melhor a Jesus Cristo. O segundo, já na sua velhice em Roma, era a sua sensibilidade pelos detalhes existentes na natureza: ao ver uma planta, uma pequena erva, uma flor ou fruta, um pequeno verme ou qualquer outro animal, São Inácio contemplava e levantava os olhos aos céus, penetrando no mais interior e no mais remotos dos sentidos.

Fica claro na espiritualidade ecológica inaciana o desejo e o dever de colaborar com o Criador para que todas as criaturas possam continuar existindo e glorificando a Deus, preservando a Casa Comum que Ele nos confiou para ser administrada com sabedoria e responsabilidade. Hoje, cabe a todos nós a missão de cuidar e zelar pela obra criacional, eliminando a exploração irracional da natureza, evitando a destruição dos biomas e a extinção dos seres vivos, e lutando contra o esvaziamento da dimensão transcendente de toda a Criação, pois Deus viu que tudo o que foi criado era muito bom (Gn.1,26-31).

Nos últimos anos, a Companhia de Jesus elaborou dois documentos voltados para as questões socioambientais (Vivemos em um mundo fragmentado e Curar um mundo ferido), além de colocar o cuidado da Casa Comum Planetária como uma de suas principais preferências apostólicas. São documentos com reflexões teológicas e espirituais, além de sugestões de ações práticas para enfrentar a grave crise ecológica em que vivemos.

Com a ajuda e inspiração de Santo Inácio de Loyola possamos trabalhar para preservar a Casa Comum, que é obra do Criador, conforme os apelos do Papa Francisco na Encíclica Laudato Si’.

 

Padre Josafá Carlos de Siqueira SJ

Vigário Episcopal para o Meio Ambiente e Sustentabilidade da Arquidiocese do Rio de Janeiro.

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