As Sete Palavras de Cristo na Cruz

Ao passar os 40 dias do período quaresmal e adentrar a Semana Santa, que é a Semana Maior para os cristãos, cabe a nós lembrarmos das sete palavras de Jesus na Cruz. O número sete na Sagrada Escritura significa perfeição ou totalidade. Até do alto da Cruz Deus é perfeito, e para selar o seu mistério de amor com a Humanidade, Cristo, antes de morrer, profere as sete palavras. As sete palavras de Cristo na Cruz costumam ser meditadas na Sexta-Feira da Paixão ou em outra ocasião conforme a tradição local.

Nesse momento, Jesus estava tomado de grande angústia devido ao que Ele estava sofrendo e o que ainda estava por vir. Jesus sabia que era necessário Ele passar por tudo aquilo, mas diante da crueldade que fizeram com Ele, Jesus profere tais palavras. Os evangelistas recuperam essas palavras e dão um forte significado para esse momento.
O profeta Isaías, no Capítulo 53, em que retrata o servo sofredor, diz: “como um cordeiro que se conduz ao matadouro, Ele não abriu a boca” (Is 53,7). Podemos comparar esse texto de Isaías referido de servo sofredor com Jesus. As palavras que Jesus profere são palavras de angústia e de dor, como de alguém que está prestes a morrer. A Igreja sempre guardou com carinho essas sete palavras de Cristo na Cruz e deu a elas o seu rico significado. Jesus esvazia-se totalmente, sai de si mesmo e se dirige aos outros.

A primeira palavra que Jesus profere do alto da cruz é: “Pai, perdoai-lhes porque eles não sabem o que fazem” (Lc 23,34). Durante toda a sua vida, Jesus pregou o perdão e amor de Deus a todos. Quando se encontrava com os pecadores, mostrava o rosto da misericórdia de Deus. O perdão fez parte da vida de Jesus e os seus seguidores devem seguir o seu exemplo. Por isso, Jesus perdoa até aqueles que Lhe condenaram à morte.
Sabemos como é difícil perdoar, com certeza não perdoaríamos alguém que nos condenasse à morte injustamente. Muitas vezes, por coisa pequena, não perdoamos o nosso semelhante, não conseguimos colocar a oração do Pai Nosso em prática, que dirá perdoar aquele que nos ofendeu. Mas Jesus, sendo o filho de Deus e sabendo que era necessário que a Escritura se cumprisse, perdoa aqueles que o conduzem à morte. Jesus ainda sabia que aqueles que estavam O crucificando não faziam aquilo porque queriam, mas faziam porque eram mandados, sobretudo, pelas autoridades políticas.

Por mais que seja difícil perdoar, é melhor perdoar do que condenar, o perdão alivia a alma e nos deixa mais leves. Aprendamos, pois, do Mestre, que perdoou até mesmo aqueles que Lhe condenaram.
A segunda Palavra de Cristo na Cruz é: “Hoje mesmo estarás comigo no Paraíso” (Lc 23,43). Jesus morre entre dois ladrões, enquanto um O insultava, dizendo que se fosse de fato Deus, os salvaria da morte. O outro manda que esse Se cale e diz que Ele não respeita nem a Deus que sofre o mesmo castigo que Ele. Jesus diz a esse “bom ladrão”: “De hoje em diante estarás comigo no Paraíso”. O paraíso não é simplesmente “um lugar”, mas uma situação de plenitude da vida, na qual não haverá mais dor, sofrimento e pranto. Nesse lugar, habitará a justiça e a paz. Que possamos construir o paraíso aqui na terra e vivê-lo de maneira plena no céu, construamos aqui a verdadeira paz e a justiça.

Que ao final da nossa vida, o Senhor também possa dizer para nós: “Hoje mesmo estarás comigo no Paraíso” (Lc 23,43). Vivamos a nossa vida de acordo com o Evangelho para que isso aconteça. Desde o nosso batismo, somos chamados a trilhar uma vida pautada na santidade e para ser luz na vida do próximo. Que ao final da nossa vida, a luz do Senhor nos alcance.

A terceira palavra de Cristo na Cruz é: “Mulher, eis aí o teu filho; filho eis aí a tua mãe” (Jo 19,26). Com essa fala, Jesus entrega o discípulo aos cuidados da sua Mãe e sua Mãe aos cuidados do discípulo. Ao entregar Maria ao discípulo, Ele a entrega à Humanidade inteira, por isso Maria é a Mãe da Igreja e da Humanidade. A partir desse momento, o discípulo a acolhe consigo e cuida dela. João, também de pé junto à Cruz, representa todo seguidor fiel de Jesus, mesmo nos momentos de crise. Esse momento também nos ensina a não nos desesperarmos diante do sofrimento, pois o caminho do calvário é necessário para se chegar à glória da ressurreição.

Quão grande presente Jesus nos deu, de termos como mãe a sua própria Mãe. Maria é mãe de todos nós e, consequentemente, Mãe da Igreja, pois o povo de Deus forma a Igreja. Tenhamos Maria como Mãe, que possamos nutrir em nós a espiritualidade mariana, sobretudo, rezando todos os dias o santo terço, para que ela nos ajude na luta contra o mal.

A quarta palavra é: “Meu Deus, Meu Deus, por que me abandonaste”? (Mt 27, 46). Jesus se sente num momento de esvaziamento e abandono, Ele grita, junto com toda a Humanidade sofredora, e grita por aqueles que resolveram abandonar Deus e seguir os seus próprios interesses. Nos dias de hoje, Ele continua gritando por tantos que O abandonam e não querem ouvir a Sua voz. Logicamente, Jesus tinha certeza de que Deus estava com Ele, e sabia que era necessário Ele passar pela cruz, mas ele grita, numa forma de chamar a atenção de tantos corações insensíveis que de forma cruel entregaram o filho do homem.

Algumas vezes, queremos fazer como Jesus e perguntar a Deus: “Meu Deus, Meu Deus, porque me abandonaste”? Lançamos essa pergunta diante de alguma situação que passamos, normalmente, alguma situação de dificuldade. Mas tenhamos a certeza no coração de que Deus nunca nos abandona, ao contrário, Ele sempre está conosco e se aconteceu algo não muito agradável conosco agora, com certeza Deus está preparando algo melhor para nós mais adiante.

A quinta palavra é “Tenho sede” (Jo 19,28). Jesus, sabendo que se aproximava a hora de entregar o seu espírito ao Pai e de selar de uma vez por todas a aliança entre o céu e a terra, diz a frase: “Tenho sede”. Os soldados embebedam vinagre na ponta de uma esponja e levam-na a boca de Jesus, e Ele diz: “Tudo está consumado”. A partir desse momento, Ele entrega o seu espírito a Deus, dando o último suspiro.

Jesus diz essa frase “tenho sede” (Jo 19,28), pois tem sede de entregar a sua vida ao Pai e sabia que por meio de sua morte muitas almas seriam salvas. Essa sede que Jesus sente é mais do que uma sede física, mas é uma sede de entregar-Se completamente ao Pai.

A sexta palavra é: “Tudo está consumado” (Jo 19,30). Jesus, após beber do vinagre, diz que tudo está consumado, ou seja, o tempo se cumpriu, a sua missão aqui na terra terminou. Jesus esvazia-se totalmente, se abaixa totalmente e nos resgata do pecado. Com a sua morte, Jesus desce à mansão dos mortos para resgatar aqueles que foram feridos pelo pecado, resgata Adão, o primeiro homem, e ressurge glorioso para nos ensinar o caminho da liberdade, longe do pecado. Do madeiro da cruz, brota a árvore da vida.

Que ao final da nossa vida possamos dizer como Jesus: “Tudo está consumado” (Jo 19,30), ou como Paulo, “Combati o bom combate”, que possamos nos consumir no anúncio do Evangelho e ser sinal de santidade a quem se aproxima de nós.

A sétima palavra é: “Pai, em tuas mãos entrego meu espírito” (Lc 23,46). Essa foi a entrega final de Jesus, já quando não suportava mais a dor dos braços esticados na cruz, dos pés juntos com prego e da coroa de espinhos cravando a sua testa. Jesus já havia suportado muito as dores, mas chegou um momento em que era melhor Ele se entregar e nos braços do Pai ser curado de suas dores. Na vida eterna, não haverá mais dor e nem sofrimento, será somente alegrias ao lado de Deus.

Jesus confia plenamente no Pai e sabia que ao entregar o seu espírito plenamente nas mãos de Deus, Ele ressuscitaria ao terceiro dia. Com a morte de Jesus, a aliança entre céu e terra se concretizaria plenamente.
Confiemos em Deus, da mesma forma que Jesus, e aceitemos fazer a Sua santa vontade. Que à semelhança de Jesus possamos dizer ao final de nossa vida: “Pai, em Tuas mãos entrego meu espírito”.
Portanto, irmãos e irmãs, guardemos em nosso coração as sete palavras de Cristo na cruz. Se pudermos, participemos desse momento na Semana Santa. E que da cruz possamos chegar à glória eterna, ao lado de Deus.

 

Orani João, Cardeal Tempesta, O. Cist.
Arcebispo Metropolitano de São Sebastião do Rio de Janeiro, RJ

 

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