Dom Orani, o Pastor da Amazônia

Em 8 de dezembro de 2004, Dom Orani João Tempesta iniciou seu ministério episcopal como arcebispo metropolitano de Belém do Pará. O início de sua missão em terras paraenses inaugurou, também, seu encontro com uma nova realidade, muitas vezes, ainda, desconhecida do Sul e Sudeste do Brasil. Foi o encontro com a Igreja viva que existe na Amazônia.

Esse encontro não poderia ser mais significativo, pois é, justamente, Belém do Pará o Portal da Amazônia. A partir de Belém iniciou-se todo o processo de interiorização da Amazônia nos idos do século XVIII. E a partir de sua posse canônica, a Amazônia passa a ser, novamente, desbravada. É um encontro com uma região rica, não apenas pela sua biodiversidade e suas florestas intocadas, mas, acima de tudo, encontro com um povo, com uma cultura exuberante, com uma Igreja com rosto amazônico, uma Igreja Amazônida.

Ali, não chegou como quem tem respostas prontas para tudo, mas chegou como alguém disposto a conhecer, compreender e encontrar as pessoas que tornam essa região tão rica em fé, cultura e criatividade. Mas, também, uma região com dificuldades, desafios, dores e sofrimentos.

Sua tarefa não era fácil: chegava para substituir o grande D. Vicente Joaquim Zico, que pastoreou aquele povo com zelo e carinho, muito estimado por todos, um mineiro que assumiu a alma e o próprio ser do paraense, que com seus cabelos brancos e seu sorriso, simples e sincero, alcançava o coração daquele povo. E parece que alcançou, também, o coração do novo arcebispo.

Desde sua chegada à Belém, Dom Orani acolheu e assumiu, para si, o cuidado com Dom Vicente, acolheu e cuidou como quem cuida de um pai. Na residência episcopal, Dom Orani fazia questão que D. Vicente sentasse à cabeceira da mesa, sempre o convidava a acompanhá-lo nas grandes celebrações da arquidiocese, sempre lhe concedia a palavra. Esse cuidado e esse carinho com Dom Vicente acabaram tornando-se cuidado e carinho com o povo paraense. Ao ver esse jeito carinhoso de cuidar de Dom Vicente, Dom Orani foi encontrando espaço no coração daquele povo.

Iniciou sua missão em dezembro de 2004 e logo fez questão de conhecer toda a realidade, visitou todas as regiões episcopais e territórios paroquiais, ocasião para encontrar-se com o clero e conhecê-lo melhor, em menores grupos. Ouvindo, perguntando, compreendendo, em seu coração, as complexidades daquela realidade em que ora iniciava seu pastoreio. Vislumbrou uma Igreja em expansão, com muitos templos em construção, as dificuldades de uma grande cidade e, ao mesmo tempo, com as características próprias daquela região.

Descobriu que os rios são ruas, que quando é inverno em todo Brasil, lá é verão e vice-versa, conheceu novos sabores, descobriu um ritmo diferente de levar a vida. Percebeu que no calor amazônico uma reunião marcada às 14h nunca começa antes das 15h. Aprendeu a se programar pela chuva amazônica, que cai furiosa e teimosa a cada tarde, que a princípio, até assusta, mas que depois tudo se acalma. Encontrou um povo colorido, alegre, acolhedor, uma mistura, tão rica e tão própria, que forma a identidade cultural daquele povo.

Eis que chega outubro, outubro em Belém é diferente. Desde sua chegada, Dom Orani havia participado de várias reuniões de apresentação e de planejamento do Círio de Nazaré. Mas agora, iria testemunhar aquilo que, até aquele momento, era contado por outros. Fez questão de participar de tudo e ver tudo o que acontecia. A partir daí Dom Orani não era mais o mesmo, foi tocado por essa manifestação de fé daquele povo, de forma tão intensa, que podemos dizer que existe o Círio antes e depois de Dom Orani.

Dom Orani percebeu que essa manifestação tinha que ser compartilhada e conhecida do resto do Brasil e do mundo, e fez do Círio de Nazaré um importante, para não dizer, o mais importante instrumento de evangelização da Igreja de Belém. E esse era o mote que fazia questão de ressaltar: “O Círio é acima de tudo, evangelização”. Tomou a iniciativa de convidar para cada dia da quinzena do Círio (são 15 dias de festa após a grande procissão do 2º domingo de outubro) um bispo de uma região do Brasil, iniciou a visita da imagem peregrina de Nossa Senhora de Nazaré às capitais, começando por São Paulo, passando por Belo Horizonte e já estava agendada a primeira visita à Cidade Maravilhosa, antes de ser nomeado arcebispo do Rio.

Homem incansável e cuidadoso, não mediu esforços para organizar a Cáritas Metropolitana, que ficou sob a responsabilidade dos diáconos permanentes, e como principal ação executou vários projetos junto às comunidades ribeirinhas. Comunidades essas que passaram a contar com uma presença missionária constante, através da Comunidade Mar a Dentro, mas que por diversas vezes recebia a visita do arcebispo de Belém.

Mergulhou na cultura e assumiu a própria alma do paraense, o jeito caboclo de ser. Dom Orani fazia-se próximo, sem grandes cerimônias, e era comum um padre relatar: “Dom Orani passou aqui pra tomar um café”. Conhecia cada um pelo nome, inclusive muitos leigos e leigas, ativos nas ações pastorais. Não foram poucas vezes que presenciamos Dom Orani, diante de um pedido de agenda, pegar o telefone e reorganizar os horários de modo a poder atender a mais um compromisso, que para ele não era, simplesmente, um compromisso, mas oportunidade de ser presente, de estar próximo.

Essa proximidade manifestava-se no contato com o povo, no contato com o clero, mas também e de modo muito evidente no contato com os bispos da Amazônia. Nos diversos encontros, tanto do Regional como no encontro dos bispos da Amazônia Legal. Em 2007, foi um dos bispos da Amazônia presentes na V Conferência do Episcopado Latino-americano e Caribenho. Essa experiência do V Celam foi imediatamente acolhida em Belém, surgindo o projeto “Belém em Missão”, dando um rosto missionário àquela Igreja que tem a missão como sua vocação natural.

Outro elemento importante do pastoreio de Dom Orani, em Belém, foi o cuidado e desenvolvimento da Rede Nazaré de Comunicação, com rádio, TV, jornal e portal na internet. Dom Orani não poupou esforços, tanto nas iniciativas de modernização de equipamentos e estruturas, como do avanço da programação e da integração de toda a Amazônia Legal, através do sinal da TV Nazaré e de suas repetidoras, levando cultura, fé, informação e, acima de tudo, integrando toda a ação da Igreja presente na Região Amazônica.

Em 27 de fevereiro de 2009, Dom Orani é nomeado arcebispo de São Sebastião do Rio de Janeiro, despedindo-se de Belém em 16 de abril de 2009, na Praça Santuário, em frente à majestosa Basílica-Santuário de Nazaré, em santa missa concelebrada por grande parte do clero e diante de uma multidão de fiéis. Dom Orani deixava as terras paraenses, mas com as sementes que lançou e com o amor com que pastoreou aquele povo, podemos afirmar que nunca deixará de ser lembrado como o Pastor da Amazônia.

 

Padre Carlos Augusto Azevedo da Silva

Vigário paroquial da Paróquia Divino Espírito Santo e São João Batista, no Maracanã

 

 

 

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