“Misericórdia, ó Senhor, pois pecamos” (Sl 50/51).
Iniciamos o tempo da Quaresma! Percorreremos um tempo de quarenta dias com Jesus no deserto até Ele sofrer a paixão, morte e posterior ressurreição. O tempo da Quaresma é um período de um retiro espiritual que realizamos por quarenta dias em que somos convidados a viver intensamente a penitência, a oração e a caridade.
O tempo da Quaresma é um tempo de reflexão e de agradecer a Deus por nos ter dado o seu filho Jesus e permitido que Ele morresse na Cruz para nos salvar. Ao longo do tempo da Quaresma, não se entoa o hino de louvor nem o Aleluia, que retornam na grande celebração da Vigília Pascal. Os instrumentos também devem ser tocados de maneira mais branda.
No tempo da Quaresma, a cor litúrgica predominante é roxo, que indica um tempo de penitência e reflexão rumo à Páscoa. No quarto Domingo da Quaresma, a cor é rosa, pois é o domingo da alegria (Laetare), significando que se aproxima a ressurreição do Senhor.
A Igreja no Brasil, ao longo do tempo da Quaresma, vive a Campanha da Fraternidade, que este ano terá como tema: “Fraternidade e amizade social” e como lema: “Vós sois todos irmãos e irmãs” (Mt 23,8). A celebração da Quarta-Feira de Cinzas abre a Campanha da Fraternidade que somos chamados a viver, sobretudo, no tempo da Quaresma. O tema deste ano nos convida a viver todos como irmãos e optarmos pelo caminho da paz, todos somos irmãos através do Batismo. Traçando o caminho da fraternidade e amizade social é possível construir a paz.
A Quarta-Feira de Cinzas nos convida ao jejum e abstinência. Portanto, neste dia e depois, se possível, em todas as sextas-feiras da Quaresma somos chamados a fazer penitência. O costume em geral é não comer carne vermelha e realizar o jejum, tirando uma das três refeições do dia, e ainda em uma delas fazê-la de maneira leve. Existem outras práticas de jejum que podemos fazer ao longo da Quaresma, como por exemplo, tirar o doce, refrigerante, a bebida alcóolica, ou outro gesto penitencial. Tudo isso com o intuito de nos aproximarmos mais de Deus e darmos passos na vida de conversão.
Na celebração desta quarta-feira, o ato penitencial é omitido, pois após a homilia acontece a bênção e distribuição das cinzas, como forma de reparação dos nossos pecados. Ao impor as cinzas o padre diz: “convertei-vos e crede no Evangelho” ou “lembra-te que és pó, e ao pó hás de voltar”. Durante a Quaresma, há o convite forte para a conversão e mudança de vida.
A primeira leitura dessa missa é da profecia de Joel (Jl 2, 12-18), Deus fala por meio do profeta ao povo de Deus que voltava do exílio do Babilônia, para voltar-se a Ele de todo o coração, por meio de jejum, esmola e oração. O Senhor diz para rasgar o coração e não vestes. Essa leitura nos motiva a fazer o mesmo, iniciando o período quaresmal, devemos deixar de lado tudo aquilo que nos afasta do Senhor e por meio da oração, caridade e jejum, voltar-se para Ele de todo o coração. O Senhor é benigno e compassivo, e sempre está pronto a perdoar as nossas culpas, e esse tempo quaresmal é propício para a penitência e para se reconciliar com Deus.
O Salmo responsorial é o 50(51), é um salmo penitencial, muito usado neste tempo quaresmal e em celebrações penitenciais. O salmista se reconhece pecador e pede ao Senhor para que tenha compaixão de suas faltas e lhe dê um coração novo, que seja puro. Inclusive podemos recitar esse salmo antes de nos confessarmos.
A segunda leitura dessa missa é da segunda Carta de São Paulo aos Coríntios (2Cor 5,20-6,2), Paulo nos diz que somos embaixadores de Cristo e, em nome de Cristo, devemos nos reconciliar com Deus. Deus fez de seu filho pecador para morrer na cruz e nos salvar, e hoje é o dia salvação e o momento favorável. Aproveitemos esse tempo quaresmal e façamos a nossa confissão sacramental, e após sermos reconciliados com Deus, possamos exortar as outras pessoas que conhecemos para que se confessem também.
O Evangelho é de Mateus (Mt 6,1-6.16-18), Jesus alerta aos discípulos para não praticarem a justiça na frente dos homens, quando der esmolas, praticar jejum ou rezar a Deus, não precisa mostrar para ninguém que está fazendo, mas basta Deus saber que você pratica. Jesus diz que quando der esmola, que a mão direita não saiba o que fez a mão esquerda, quando orardes se feche em seu quarto e Deus que está oculto verá a sua oração, e quando praticar o jejum, não desfigure o rosto ou fique triste, mas o jejum de verdade agrada a Deus e não precisa ser mostrado para ninguém.
Agindo dessa maneira que Jesus orienta no Evangelho receberemos de Deus a nossa recompensa e alcançaremos como meta final a vida eterna. O tempo da Quaresma nos convida a essas três práticas para alcançarmos a salvação e nos reconciliarmos com Deus. O jejum não necessariamente é se abster de alguma refeição, mas o jejum consiste em se abster de algo que nos afasta de Deus. A caridade podemos sempre fazer, ajudando o próximo com bem material ou físico e acolhendo de alguma forma o próximo. A penitência é o que dá sentido ao jejum e a caridade, pois são práticas penitenciais. Outras práticas penitenciais, ao longo desse tempo, são rezar e a confissão sacramental. Algumas paróquias, ao longo desse tempo quaresmal, colocam missa logo cedo, de madrugada, como prática penitencial com as procissões da Penitência, prática muito recomendável.
Portanto, irmãos e irmãs, que possamos iniciar bem nossa trajetória quaresmal e que no final desse tempo quaresmal, possamos receber de Deus a devida recompensa. Atravessemos o deserto para chegarmos à terra prometida, e passemos do calvário as alegrias da ressurreição.
Orani João, Cardeal Tempesta, O. Cist.
Arcebispo Metropolitano de São Sebastião do Rio de Janeiro, RJ