Simpósio Teológico Internacional PUC-Rio – 15 / 03 / 2024

Tema – “Por uma teologia fundamental do sacerdócio” 

Abertura

Orani João Cardeal Tempesta, O.Cist.

Arcebispo Metropolitano de São Sebastião do Rio de Janeiro

 

Caros irmãos e irmãs em Cristo,

 

É com grande alegria que hoje recebemos a todos, aqui na PUC-Rio, para este Simpósio Teológico Internacional, que vai tratar do tema do sacerdócio, tanto sob o enfoque da teologia, como da missionariedade.

Desejo saudar cada um dos presentes e os membros que compõem conosco esta mesa de abertura:

– Dom Gilson Andrade da Silva, bispo de Nova

Iguaçu e presidente do Regional Leste 1

– Padre Anderson Antonio Pedroso, reitor da PUC-Rio

– Padre Waldecir Gonzaga, diretor do Departamento de Teologia da PUC-Rio.

Este evento foi originalmente idealizado pelo Cardeal Marc Ouellet, atualmente prefeito emérito do Dicastério para os Bispos, que já o apresentou no Vaticano e em outras dioceses, inclusive no Brasil. Temos hoje o privilégio de recebê-lo em nossa universidade católica, para proferir a conferência que dá título a esse evento: “Por uma teologia fundamental do sacerdócio”.

Seremos também agraciados pela participação do padre Vitor Galdino Feller, vigário geral da Arquidiocese de Florianópolis, que tem uma ampla atuação pastoral e acadêmica no exercício do seu ministério sacerdotal. Ele vai nos falar sobre “Sacerdócio e missionariedade”.

São muitos e diversificados os aspectos que as linhas gerais deste simpósio nos oferecem, as quais serão competente e profundamente explicitadas pelos nossos conferencistas.

Desejo, entretanto, destacar brevemente aquele que é o fundamento do sacerdócio, e que o Cardeal Ouellet anuncia nas linhas gerais que propõe para este simpósio – trata-se da abordagem sobre uma “eclesiologia trinitária e nupcial”.

É pertinente observarmos que uma visão pretensamente atualizada do sacerdócio acaba por reduzi-lo ao exercício de um ministério eficiente e funcional, bem ao modo da mentalidade produtivista que domina o nosso mundo, e considera com fim único a produção máxima que números e estatísticas podem comprovar.

Enfrentando essa distorção, o Cardeal Ouellet tem a audácia de voltar às raízes mais profundas do sacerdócio, quando aponta seu fundamento, que é, primordialmente, doação de si mesmo – uma doação que tem seu modelo e origem na doação mútua das pessoas trinitárias, se realiza na Igreja e nos chama a participar dessa comunhão de amor. Essa é justamente a vocação nupcial que se expressa na relação com Deus desde o Antigo Testamento, e se plenifica na entrega que o próprio Jesus Cristo faz de si mesmo, totalmente por amor, conforme São Paulo fala na Carta aos Efésios:

“Progredi na caridade, segundo o exemplo de Cristo, que nos amou e por nós se entregou a Deus como oferenda e sacrifício de agradável odor.” (Ef 5,2)

Permitam-me citar, a seguir, as palavras do próprio Cardeal Ouellet sobre o alcance da eclesiologia trinitária e nupcial:

“Uma visão fundamental do sacerdócio, centrada na articulação intrínseca entre o sacerdócio dos fiéis e o sacerdócio hierárquico, pode desenvolver uma motivação mais explícita com a ajuda de uma eclesiologia trinitária e nupcial, que se baseia sobre o dinamismo da comunhão eclesial, encorajando vivamente o empenho no estado de vida próprio, matrimonial, sacerdotal ou consagrada”

Chegamos aqui a um outro ponto fundamental do tema deste simpósio: a articulação entre o sacerdócio dos fiéis e o sacerdócio hierárquico, ainda hoje frequentemente esquecida, apesar da ênfase recebida no Concílio Vaticano II, que nos inspira através do documento Lumen Gentium, do qual extraí este significativo trecho:

“O sacerdócio comum dos fiéis e o sacerdócio ministerial ou hierárquico, embora se diferenciem essencialmente e não apenas em grau, ordenam-se mutuamente um ao outro; pois um e outro participam, a seu modo, do único sacerdócio de Cristo.” (LG 10) 

De fato, o sacerdócio comum dos fiéis tem sua fonte no Batismo e alicerça o empenho por uma Igreja sinodal, onde todos possam ouvir e dialogar como filhos de Deus, conforme o desejo do Papa Francisco.

Voltando às linhas gerais do nosso simpósio, cito mais um trecho contido no texto do Cardeal Ouellet. Trata-se de mais um desdobramento da eclesiologia trinitária e nupcial, anteriormente citada. Ele assim se expressa:

“Uma eclesiologia trinitária e nupcial […] pode não só harmonizar os dons hierárquicos e carismáticos na Igreja, mas, sobretudo, fundamentar a missão diferenciada dos membros do Corpo de Cristo”

Chegamos assim à missionariedade, tema sobre o qual o padre Vitor Galdino Feller certamente vai nos esclarecer pontos fundamentais, que hoje nos provocam a assumir o concreto posicionamento de uma “Igreja em saída”.

Gostaria de lembrar, ainda, que o nosso atual simpósio teve um evento precursor, com a mesma temática. Foi o simpósio “Por uma teologia fundamental do sacerdócio”, promovido pela então Congregação para os Bispos, no Vaticano, em fevereiro de 2022. Naquela ocasião, o Papa Francisco proferiu um discurso, no qual nos legou profundos ensinamentos sobre o sacerdócio, inclusive apontando importantes caminhos para a missionariedade.

Destaco alguns pontos daquele discurso, que muitos aqui devem conhecer, os quais considero marcantes para introduzir o nosso evento.

O Papa Francisco enumera as quatro colunas constitutivas da nossa vida sacerdotal, que dão solidez à pessoa do sacerdote, as quais ele chama de quatro “proximidades”, porque seguem o estilo de Deus, que é fundamentalmente um estilo de proximidade (cf. Dt 4,7): a proximidade a Deus, ao bispo, entre os presbíteros e ao povo.

Ele acredita que essas quatro colunas, essas quatro “proximidades”, podem ajudar de forma prática, concreta e esperançosa a reavivar o dom e a fecundidade que um dia nos foram prometidos, a manter vivo esse dom.

 

Proximidade com Deus

O sacerdote é convidado, acima de tudo, a cultivar essa proximidade, a intimidade com Deus, e a partir dessa relação poderá obter todas as forças necessárias para o seu ministério. A relação com Deus é, por assim dizer, o enxerto que nos mantém dentro de um vínculo de fecundidade. Sem uma relação significativa com o Senhor, o nosso ministério está destinado a se tornar estéril.

 

Proximidade com o bispo

A obediência não é um atributo disciplinar, mas a característica mais forte dos vínculos que nos unem em comunhão. Obedecer, neste caso ao bispo, significa aprender a escutar e lembrar que ninguém pode se dizer detentor da vontade de Deus, e que ela deve ser compreendida apenas por meio do discernimento.

 

  Proximidade entre presbíteros

O amor fraterno, para os presbíteros, não permanece fechado em um pequeno grupo, mas se conjuga como caridade pastoral (cf. exortação apostólica pós-sinodal Pastores dabo vobis, n. 23), que impele a vivê-lo concretamente na missão […] E só quem procura amar está seguro. […] Por isso, o amor entre os presbíteros tem a função de guardar, de se guardar mutuamente.

 

Proximidade com o povo

A missão é uma paixão por Jesus, e simultaneamente uma paixão pelo seu povo. Quando paramos diante de Jesus crucificado, reconhecemos todo o seu amor que nos dignifica e sustenta, mas lá também, se não formos cegos, começamos a perceber que este olhar de Jesus se alonga e dirige, cheio de afeto e ardor, a todo o seu povo. Lá descobrimos novamente que Ele quer servir-Se de nós para chegar cada vez mais perto do seu povo amado. Toma-nos do meio do povo e envia-nos ao povo, de tal modo que a nossa identidade não se compreende sem essa pertença” (n. 268). A identidade sacerdotal não pode ser entendida sem a pertença ao Santo Povo fiel de Deus.

Ao finalizar esta minha breve fala, quero desejar a todos que os fecundos temas propostos nesta manhã se prolonguem em futuras reflexões e ações concretas. Possam elas enriquecer e renovar a vocação sacerdotal que um dia moveu nossos corações para respondermos ao chamado de Cristo.

Concluo com estas palavras também extraídas do discurso do Papa Francisco:

“Sinto que Jesus, neste momento histórico, nos convida mais uma vez a ‘avançar para águas mais profundas’ (cf. Lc 5,4) com a confiança de que Ele é o Senhor da história e que, guiados por Ele, poderemos discernir o horizonte a percorrer.”

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