INTRODUÇÃO
A defesa do direito a um meio ambiente equilibrado e saudável evidencia-se, como campo de atenção durante o século XX, no qual o problema ambiental se intensificou e vem se transformando numa questão mundial e preocupante devido às mudanças climáticas que tem causado.
Em regiões e países com índice de desenvolvimento elevado, ocorre um nível de degradação ambiental superior aos outros, afetando também os países em desenvolvimento. No Brasil, o meio ambiente é um assunto bastante discutido atualmente, alertando-se para sua questão social, pois o país possui condições climáticas diversas, um patrimônio ambiental gigantesco e relevante e a maior diversidade biológica do planeta. Portanto, as variações climáticas afetarão a qualidade de vida da população, no que se relaciona à moradia, saúde, educação, dentre outros
Este artigo analisa a relação homem-natureza-sociedade por meio da leitura da Epístola Laudato Si, revelando a dialeticidade das relações entre a natureza externa e a humana através da percepção do homem sobre o mundo que o cerca.
A análise da obra será feita a partir da perspectiva que estuda as relações entre o meio ambiente físico e a sociedade. Nessa relação, os sujeitos são compreendidos dentro do seu contexto social, em sua relação com as demais dimensões, tecendo os diferentes códigos e saberes a partir de uma visão multifacetada da realidade.
Nessa análise buscamos observar o enfoque fenomenológico, social, natural, através da leitura das contradições que cercam essas relações, porque “é preciso dizer como habitamos o nosso espaço vital de acordo com todas as dialéticas da vida, como nos enraizamos, dia a dia, num canto do mundo” (BACHELARD, 2005).
Propõe-se, em princípio, que se compreenda o ambiente sob a perspectiva de diferentes áreas de conhecimento, objetivando refletir sobre algumas concepções inerentes a esse fenômeno.
A IGREJA E A ABERTURA PARA QUESTÕES AMBIENTAIS
O Concílio Vaticano II representou o marco histórico da abertura da Igreja Católica à renovação, com liberdade e compromisso para com os pobres. Após o Concílio Vaticano II foram elaboradas várias encíclicas, cartas apostólicas e instruções da Congregação para a Doutrina da Fé.
A II Conferência Geral do Episcopado Latino-americano ocorreu em Medellín, Colômbia, em 1968, e a III Conferência, em Puebla, México, em 1979, alicerçadas pelos avanços do Concílio Vaticano II. O Documento de Medellin (DM) anunciou o novo modelo de Igreja, que propôs a participação comunitária do povo, buscando alternativas libertadoras em consonância com as aspirações dos pobres, marginalizados e oprimidos, posicionando-se claramente a favor da libertação integral dos pobres, pois a miséria exige soluções concretas e justiça social para todos.
Outrossim, refletiu-se acerca do reconhecimento da missão da Igreja em estar a serviço do povo e não a serviço de si mesmo. Neste aspecto, alicerçou-se o compromisso com a justiça social e a promoção humana.
O Documento de Puebla (DP) reforçou a opção metodológica assumida em Medellín, qual seja, a rejeição da pobreza e a exigência da conquista de políticas públicas econômicas e sociais para os menos favorecidos. O povo precisa ficar atento para o fato de que, embora a prescrição legal expressa na instituição de uma política pública demonstre intenções em prol da solução de um problema, não existe a garantia de que o que foi anunciado, à priori, se transforme em ação e, tampouco, que a demanda objeto da ação seja atendida. Pois no processo de implementação as ações planejadas por grupos ou indivíduos podem não acontecer conforme o previsto.
Sabe-se que a constituição das políticas públicas econômicas e sociais expressam ao mesmo tempo os interesses econômicos articulados a projetos de sociedade. Portanto, os textos legais acordados nos documentos constituem os enunciados das políticas, mas muitas vezes escondem, sob a sua formalidade, os interesses econômicos que se articulam a projetos políticos de sociedade, revelando, entre outros aspectos, os sujeitos que foram ouvidos e a correlação de forças políticas imbricadas no decorrer de sua elaboração.
Nesse aspecto, a Igreja precisa assumir o seu papel perante a sociedade e lutar contra as desigualdades sociais que estão na raiz das políticas neoliberais, que, como expressão do capitalismo, não visam à promoção das transformações estruturais e nem a incorporação da cidadania para a grande maioria da população brasileira, pois o enfrentamento da crise social do país não faz parte do projeto neoliberal, marcado por mecanismos de exclusão que regulam o capital a serviço de uma minoria.
A IV Conferência Geral do Episcopado Latino-americano aconteceu na capital da República Dominicana, em Santo Domingo, tendo como temática central a Nova Evangelização, promoção humana e cultura cristã. Nos documentos gestados nessa conferência, avançou-se no reconhecimento de que a mulher é sujeito histórico, eclesial e teológico tanto na família quanto na Igreja e sociedade. O Documento de Santo Domingo assume os direitos garantidos nas Conferências de Medellin e Puebla e os aprofunda.
O documento denuncia a miséria a que são subjugadas as famílias, como também a exploração que sofrem crianças, adolescentes e mulheres que trabalham de forma escrava ou sem mínimas condições de dignidade. Assim, a ênfase recai sobre a forma dinâmica e através do diálogo com a modernidade e a pós-modernidade. Esta Nova Evangelização deverá se expressar por meio de novos métodos, considerando a cultura diversa dos povos, especificamente dos povos indígenas e afro-americanos.
O documento de São Domingo faz muitas denúncias em relação a tudo que atenta contra a vida, alertando sobre as condições socioeconômicas precárias. Entre outras questões, o documento analisa várias temáticas que contextualizam as situações de opressão da mulher, exigindo que a Igreja assuma o compromisso de participar ativamente da conscientização acerca da justiça social, enfatizando que a mulher tem papel evangelizador, mesmo sendo leigas.
Compreende-se, claramente, que a Igreja, a partir desses documentos, assume que o homem é um ser histórico social, além de seus necessários fundamentos metafísicos, portanto, se esta pretende realizar a Nova Evangelização precisa entender os sinais dos tempos.
Documentos Pós-Concílio Vaticano II
Os documentos produzidos pós-concílio Vaticano II, a Carta Encíclica Humanae Vitae HV escrita em 1968 pelo Papa Paulo VI reconhece que o mundo passa por mudanças econômico sociais, reconhecendo ser necessária a revisão das normas éticas e confirmando a competência do Magistério da Igreja de interpretar a lei moral, declarando seus princípios. As discussões trataram, de forma genérica, sobre o homem, o amor conjugal e suas características.
Em 1988 a encíclica Humanae Vitae foi avaliada no II Congresso Internacional de Teologia Moral em Roma, mas o Papa João Paulo II continuou repetindo que transgredir a norma de não regular a natalidade atenta contra a própria santidade de Deus, não deixando margem para a exceção, sob pena de se esvaziar a cruz de Cristo.
A esse respeito, o Papa Francisco, na encíclica ‘Laudato Si’ (Louvado Seja) escrita em 2015, louva a Deus através dos elementos da criação e fala sobre os ataques contra a vida humana, considerando o aborto, o uso de embriões em pesquisas científicas e o controle populacional como um desrespeito à criação.
Uma vez que tudo está relacionado, também não é compatível a defesa da natureza com a justificação do aborto. Não parece viável um percurso educativo para acolher os seres frágeis que nos rodeiam e que, às vezes, são molestos e inoportunos, quando não se dá proteção a um embrião humano ainda que a sua chegada seja causa de incómodos e dificuldades: Se se perde a sensibilidade pessoal e social ao acolhimento duma nova vida, definham também outras formas de acolhimento úteis à vida social (CARTA ENCÍCLICA LAUDATO SI. DO SANTO PADRE FRANCISCO SOBRE O CUIDADO DA CASA COMUM, 2015, p. 94).
O Pontífice explica que, se no coração do homem não existe ternura, compaixão e preocupação com os seres humanos, então não existe, dentro do homem, um sentimento de união com os seres da natureza.
A Instrução sobre o Respeito à Vida Humana Nascente e a Dignidade da Procriação foi produzida durante o pontificado do Papa João Paulo II. O documento reflete sobre a vida humana a partir da visão antropológica do homem, discutindo a procriação artificial humana e os valores que devem ser respeitados.
Em sua contemporaneidade, o documento debate o tema da embriologia humana, partindo do princípio de que os indivíduos podem se considerar humanos desde o primeiro instante da sua existência, reforçando o ensinamento imutável da Igreja de que a eliminação da vida através do aborto é condenável em qualquer circunstância.
Em outro aspecto, a Igreja, ao abordar a pesquisa e a experimentação ensina que se deve priorizar o respeito à dignidade, à integridade e à identidade humana.
Proíbe tanto a fecundação artificial heteróloga (esperma ou óvulo de uma terceira pessoa), quanto condena a fecundação artificial homóloga (entre esposos), “in vitro” ou através de inseminação artificial, por não ser resultado de relação conjugal e por destruir embriões humanos.
Nesse sentido, compreende-se que são necessários valores e obrigações morais que a legislação civil deve orientar sobre as relações entre lei moral e lei civil a respeito de técnicas de procuração artificial, embriões e fetos humanos.
A encíclica Laudato si [Louvado seja] do Papa Francisco acrescenta uma nova contribuição à doutrina social da Igreja, tendo em vista se constituir em um texto articulado, muito específico e que cita documentos de muitas conferências episcopais.
Na encíclica, o papa não se dirige somente aos cristãos, mas aos habitantes do planeta Terra, invocando a solidariedade universal, tendo em vista unir a família na busca de um desenvolvimento sustentável e integral.
Bergoglio (Papa Francisco), no texto em questão, valoriza as palavras de Bento XVI, reiterando o convite a “eliminar as causas estruturais das disfunções da economia mundial e corrigir os modelos de crescimento que parecem incapazes de garantir o respeito do meio ambiente” (CARTA ENCÍCLICA LAUDATO SI. DO SANTO PADRE FRANCISCO SOBRE O CUIDADO DA CASA COMUM, 2015). Conforme o Papa, citando o Patriarca Ecuménico Bartolomeu, existe a «necessidade de cada um se arrepender do próprio modo de maltratar o planeta. Assim, Francisco propõe seguir o modelo de São Francisco de Assis, o qual afirma que são “inseparáveis a preocupação pela natureza, a justiça para com os pobres, o empenhamento na sociedade e a paz interior”.
No documento, também se discute sobre o tema da poluição e poluentes da atmosfera que provocam mortes prematuras entre os mais pobres, cujas causas são os pesticidas, resíduos, dentre outros, os quais transformam o planeta terra em um depósito de lixo.
Francisco argumenta que se está perante um preocupante aquecimento do sistema climático, motivado pela concentração de gases devido ao efeito estufa. Assim, a humanidade tem que se conscientizar da necessidade de mudanças de estilos de vida, além da produção e de consumo. O Papa cita:
o derretimento das calotas polares e dos glaciares, a par da perda das florestas tropicais. Os impactos mais sérios recairão, nas próximas décadas, sobre os países em vias de desenvolvimento. Por isso, tornou-se urgente e imperioso o desenvolvimento de políticas capazes de fazer com que, nos próximos anos, a emissão de anidrido carbónico e outros gases altamente poluentes se reduza drasticamente (LAUDATO SI, 2015, p. 34).
A encíclica afirma que os recursos naturais estão se esgotando, demandando a impossibilidade de sustentar o nível atual de consumo dos países mais desenvolvidos. Tal documento ressalta, ainda, a pobreza da água pública na África, à mercê da privatização deste recurso que se torna mercadoria, motivado pelas leis do mercado. Perante a “tendência para se privatizar este recurso escasso, tornando-se uma mercadoria sujeita às leis do mercado”, recorda que “o acesso à água potável e segura é um direito humano essencial, fundamental e universal” (LAUDATO SI, 2015, p. 40).
Outrossim, se ressalta, no documento, a perda da biodiversidade, o que demanda cuidado em relação ao ecossistema mundial, sendo mencionado a Amazónia e a bacia fluvial do Congo, ou os grandes lençóis freáticos e os glaciares. O papa alerta, ainda, que não se deve “ignorar também os enormes interesses económicos internacionais que, a pretexto de cuidar deles, podem atentar contra as soberanias nacionais” (LAUDATO SI, 2015, p. 40).
O direito ambiental irá associar-se ao Comércio Internacional e a Logística, tendo como um dos principais vetores, a Sustentabilidade e a manutenção saudável do Ecossistema, visto que analisa e discute as questões relacionadas aos problemas ambientais, relacionando à responsabilidade do ser humano enquanto pessoa jurídica como partícipe da proteção ao meio ambiente e à melhoria das condições de vida no planeta, como também à responsabilidade jurídica por causa de algum dano causado a esse.
É importante salientar que existe um deterioramento da qualidade da vida humana, repercutindo sobre a degradação social e acerca da sobrevivência pouco saudável em algumas cidades que sofrem com os efeitos da poluição e do caos urbano. Francisco alerta que “o ambiente humano e o ambiente natural degradam-se em conjunto e que, ambos não encontram espaço suficiente nas agendas do mundo” (LAUDATO SI, 2015).
De todo o exposto é mister que o meio ambiente se constitui em um patrimônio da Humanidade, e, por direito pertence a todos os seres humanos, estando esta inter-relação ligada à existência humana. Desta forma, a importância da manutenção cabe a todas as pessoas físicas ou jurídicas, sendo a conscientização a principal forma de combate aos problemas ambientais. Tal realidade implica na exigência em se monitorar o cumprimento das regras e da segurança jurídica, responsabilizando-se os que fazem atos prejudiciais a natureza e ao meio ambiente, despertando além do interesse ambiental, o interesse jurídico com o intuito de resguardar os ecossistemas.
Boff (1999), argumenta, em sua crítica social, embasado em um rigor intelectual teórico e/ou empírico, que a sociedade é desigual, fundamentando-se em fatores sociais, políticos e econômicos. No que diz respeito à desigualdade de classes, esta tem relação com a probabilidade de êxito em todos os campos da vida, onde o sistema elimina os fracos, não se preocupando em inseri-los à sociedade.
Por meio da lógica neoliberal, se inserir no mercado é concebido enquanto um instrumento que se volta para a aprendizagem de competências, as quais se transformam diariamente. No que diz respeito à aprendizagem de competências, embora mobilize conhecimentos, deve acontecer na prática social e produtiva.
Assim, ao proclamar a competência como responsável pelo desenvolvimento humano é uma forma sutil e perversa de excluir os filhos da classe trabalhadora, pois os filhos da burguesia desenvolvem, apesar da escola, suas capacidades.
Parte-se do princípio de que a violência simbólica pode ser definida como uma imposição arbitrária apresentada de modo disfarçado àquele que sofre a violência, ocultando as relações de força e poder. Nessa acepção, a competição é uma violência simbólica, à medida em que é imposta por um poder arbitrário cultural.
No que diz respeito à desigualdade de classes, esta tem relação com a probabilidade de êxito em todos os campos da vida, onde o sistema elimina os fracos, não se preocupando em inseri-los no contexto educacional e, nem tampouco, à sociedade.
Ao discutir sobre a probabilidade de passagem e a probabilidade de êxito, aqueles que se originaram de uma estrutura social pobre, em condições básicas de sobrevivência e informação, terão menores chances de obter êxito no mercado competitivo, fato presente na realidade desigual do sistema social brasileiro.
No lugar do antagonismo de classe definido, de um lado, pelos interesses do capital de expropriar o trabalhador e, de outro, pelos interesses dos trabalhadores, passa-se à ideia de um contínuo definido por uma estratificação social, resultante do esforço e mérito individual. Em síntese, a desigualdade real, elemento que fundamenta e define a sociedade de classes, transforma-se em uma igualdade legal, embasada numa liberdade abstrata da forma do Estado Liberal.
Através da reestruturação do capitalismo ocorreram enormes transformações no mundo social e produtivo e, também, modificações nas relações entre Estado e sociedade civil, determinado pelas necessidades do processo produtivo. Tal fato é típico das sociedades capitalistas, por meio da acelerada divisão do trabalho. Assim, o papel da força de trabalho no sistema capitalista é concebido enquanto um meio de produzir riquezas, por meio da exploração do trabalhador, o qual obedece ao ritmo de produção capitalista. Nesse trabalho, o valor se determina pelo tempo de trabalho socialmente necessário para que seja possível produzir a mercadoria. A esse respeito, uma grande quantidade de trabalhadores passa a produzir para fortalecer o capitalismo.
Vive-se, atualmente, o apogeu da modernização, cuja principal característica reside na inovação tecnológica, que possibilitará uma gama de benefícios para toda a humanidade, mas também acena com uma série de problemas estruturais que colidirão com alterações na formação econômica, social, ambiental e política da sociedade e consequentemente na concepção sobre o trabalho.
Compreende-se, a partir do exposto anteriormente, que o mundo do trabalho se transforma para atender às exigências impostas pelo sistema capitalista, trazendo novos modelos para aplicar no cenário do trabalho. Assim, o trabalho é reconfigurado e intensificado devido às novas exigências que embasam a flexibilização das relações no mundo do trabalho. Nesse processo de trabalho, o homem se torna egoísta e não tem espaço para pensar no corpo e nem nos fenômenos sociais que acontecem devido à expropriação tanto do trabalho, quanto da terra. No que diz respeito às relações entre indivíduo e sociedade, se pauta em dois extremos, quais sejam, o individualismo e o totalitarismo.
É necessário refletir acerca das ações sobre a natureza, as quais são de pertencimento humano, pois o homem planeja idealmente as possibilidades de realizar essa ação. Que o modo de produção expressa a materialidade ontológica, pois o que o homem produz está determinado pelo seu modo de vida e o que é produzido não se dissocia da forma como produz.
Transpondo-se esse enfoque para o campo da saúde, a preocupação consiste em descobrir como podem ser produzidas condições sociais e de saúde que correspondam a um nível adequado de vida; qual o processo de definição de prioridades e de formas de intervenção; qual o nível de participação política do conjunto da sociedade na elaboração e implantação de políticas sociais; como são definidos e garantidos os direitos sociais.
Trata-se de entender quais são as relações sociais que se estabelecem nas sociedades contemporâneas que podem garantir uma radicalização da vivência de todas as gerações de direitos e dos direitos fundamentais de participar e de ter direitos. O nível de preocupação com a saúde do corpo seria decorrente da estratificação social que configura determinado contexto ou território e que determina a distribuição desigual dos fatores produtores de saúde: materiais, biológicos, psicossociais e comportamentais.
As desigualdades econômicas expressas pela posição que se ocupa na estratificação social determinariam uma desigualdade de acesso aos fatores de boa ou má saúde, aumentando as iniquidades da área. Combater a desigualdade seria uma garantia de melhora do nível de saúde e para o combate à desigualdade há que se desenvolver políticas intersetoriais (econômicas, de emprego, de renda, moradia, saúde, etc.) e garantir-se a participação e o empoderamento das populações, para que estas possam colaborar mais eficazmente na transformação da sociedade. Novamente, esta ênfase na revalorização dos indivíduos como sujeitos de suas ações, sugere que, para este autor, os sujeitos estão implicados nas estruturas e estas nos significados das ações sociais.
Esse pensamento não é inédito nem recente na área ambiental e mostra sua perplexidade e indignação diante da falta de ações, de decisão e vontade política para se enfrentar o problema de maneira adequada. No artigo, aponta para o fato de que a falta de eficácia das propostas neoliberais de reforma do setor abre um espaço para a retomada dessa visão social do processo saúde- trabalho-doença.
É nesse sentido que se poderia pensar em possíveis convergências entre um enfoque de caráter estruturalista e um pensamento voltado para a ação e para o ator social, lembrando-se que a procura de um diálogo entre paradigmas acarreta o risco de se conseguir um pensamento eclético, mas não plural. Ainda resta ver se tal convergência é factível ou qual seria o grau de diálogo possível e fecundo.
O ponto de contato entre esses enfoques parece ser a preocupação com a real participação das comunidades, com base no reconhecimento de que o homem que vive nas estruturas tem uma capacidade criadora, de imaginação com a qual pode produzir novos significados e a partir daí transformar a sociedade.
É na sociabilidade com o grupo de amigos que acontece a dinâmica das relações, as quais definem os amigos mais próximos e os mais afastados, respondendo às necessidades de comunicação, solidariedade, autonomia, identidade e, principalmente, afetividade. Portanto, por meio da consideração de que a afetividade deve ser compreendida enquanto um alicerce para as relações, busca-se formar cidadãos autônomos, capazes de pensar por si próprio. As emoções e suas manifestações são aspectos indissociáveis para a educação, sendo fundamental a compreensão das expressões emocionais dos indivíduos.
Nas últimas décadas, se avançou muito em termos de conhecimento a respeito do mundo externo, mas ainda se tem dificuldade em lidar com as emoções, traumas do passado, em perdoar e em pedir perdão, demonstrando que raramente o ser humano se coloca no lugar dos outros para tentar entender suas mazelas e ajudar-se mutuamente.
O reconhecimento do amor ao próximo como condição para a transformação nas condições adversas de vida, constitui-se como um ponto para o qual ambos os trabalhos convergem e que igualmente suscita considerações teóricas sobre a determinação social e o reconhecimento da autonomia individual e coletiva como elementos criadores de novas alternativas e, portanto, transformadores da dinâmica social e da sociedade.
A evolução científica criou a nanotecnologia por meio de um conjunto de ações de pesquisa, desenvolvimento e inovação obtidas graças às especiais propriedades da matéria organizada a partir de estruturas de dimensões nanométricas. Assim, a característica do século XXI é ser uma época em que o mundo se encontra interconectado, cujos riscos se baseiam na complexidade dos efeitos que ocorrem em cadeia.
Na linguagem do Papa Francisco:
a tecnociência, bem orientada, pode produzir coisas realmente valiosas para melhorar a qualidade de vida do ser humano. [… Mas também dá] àqueles que detêm o conhecimento e, sobretudo, o poder econômico para o desfrutar, um domínio impressionante sobre o conjunto do gênero humano e do mundo inteiro […]. A verdade é que “o homem moderno não foi educado para o reto uso do poder”. (CARTA ENCÍCLICA LAUDATO SI. DO SANTO PADRE FRANCISCO SOBRE O CUIDADO DA CASA COMUM, 2015, 102-104).
Conforme Bourdieu e Wacquant (2004) no plano supra estrutural e ideológico, se introduz uma nova língua com as seguintes palavras: noções de globalização, estado mínimo, reengenharia, reestruturação produtiva, sociedade pós-industrial, sociedade pós-classista, qualidade total. Estes novos vocábulos tem a função de afirmar um pensamento e uma solução única para a crise, justificando a necessidade de reformar as relações de capital/trabalho no aparelho do estado. Tais reformas vieram ancoradas inversamente às experiências do socialismo real e às políticas do estado de bem-estar social, consideradas responsáveis pela crise.
Contemporaneamente, a comunidade científica relaciona pensamento cristão e conservação da natureza numa outra perspectiva, e não necessariamente poderei concordar com toda a citação, mas apenas a cito devido à diversidade acadêmica para o diálogo entre as diferentes formas de pensar:
aspectos da obra do influente pensador cristão Tomás de Aquino sugerem que os debates relativos à racionalidade ou irracionalidade (portanto, também aqueles relativos ao domínio ou cuidado com a criação) ignoraram que o amor é parte de qualquer relação com o Criador […]. O valor intrínseco de cada coisa é inerente à criação de Deus, pois o fim de todas as coisas é ser uma expressão da sua bondade […]. São Francisco de Assis é o santo padroeiro dos animais e do meio ambiente e promoveu uma visão cosmocêntrica (destaque meu: em termos materiais, com o objetivo de reconhecermos na criação as marcas do Criador) da vida e do universo, que é contrária a uma perspectiva de dominação humana da natureza. (BOSWORTH, A. et al. Ethics and biodiversity. Bangkok: UNESCO, 2011, p. 32-33) (Tradução nossa).
Tal passagem supracitada, anterior à Laudato si, mostra que a reflexão do Papa Francisco não se caracteriza como uma apologia revisionista, que falseia os dados em prol do cristianismo. O texto atual do Papa se constitui enquanto um documento que convida a lutar pelo homem, como se luta para acabar com o tráfico de animais em risco de extinção.
Conforme Francisco, a economia se complexifica por meio de um desenvolvimento social em função do lucro. Faz-se necessário ressaltar que as concepções sobre a política de bem-estar social se transformaram e o século XXI ameaça os interesses da vida em geral. A esse respeito, o atual momento histórico está marcado por três características: o predomínio do político sobre o econômico; o retorno do poder de Estado sobre os mercados; e, os realinhamentos em curso que obedecem à lógica da Estratégia.
Ressalta-se que o uso da força em relações internacionais voltou a ter papel central, mas não se dissocia de outras políticas, tendo em vista que uma política de defesa de um Estado torna-se decidida e executada dentro de uma estrutura externa e outra interna. O processo externo tem uma característica interestatal, pois abarca a negociação por vantagens entre as nações, nas quais a força ou sua ameaça é a medida de troca.
Nesse contexto, a economia assume todo o desenvolvimento, fundamentando-se no lucro, em que a finança sufoca a economia real. A natureza dá pistas do deterioramento ambiental, mas o homem ainda não aprendeu a lição. Existe a defesa de que a economia atual e a tecnologia resolverão os problemas ambientais, como também se afirma que os problemas da fome e miséria no mundo serão resolvidos por meio do crescimento do mercado, porém, o mercado não será capaz de garantir o desenvolvimento humano integral, nem tampouco a inclusão social.
Ao discutir sobre a ecologia social, o papa enfatiza a importância de se combater a pobreza, cuidando da natureza. Outrossim, assevera que não se pode analisar os problemas de ordem ambiental sem compreender os contextos humanos, familiares, laborais, urbanos, e da relação de cada pessoa consigo mesma.
Francisco alerta para a ecologia cultural, afirmando que mesmo apesar da existência de leis, estas não são aplicadas de forma comum nos mesmos locais e países do mundo.
No que se relaciona à ecologia humana, esta significa ter “apreço pelo próprio corpo na sua feminilidade ou masculinidade”.
Quando descreve sobre a ecologia integral na obra ‘Laudato si’, Francisco dialoga particularmente com o movimento ambientalista, indo além dos aspectos químico-físicos, biológicos, socioculturais e políticos da questão ecológica, pois no corpo do texto a integração acontece entre os vários aspectos da questão ecológica, entre a natureza externa (ciências ecológicas) e a natureza interna da pessoa (antropologia filosófica).
Conforme a passagem do Capítulo III:
se o ser humano se declara autônomo da realidade e se constitui dominador absoluto, desmorona-se a própria base da sua existência, porque, “em vez de realizar o seu papel de colaborador de Deus na obra da criação, o homem se substitui a Deus e, deste modo, acaba por provocar a revolta da natureza” […]. Não haverá uma nova relação com a natureza, sem um ser humano novo. Não há ecologia sem uma adequada antropologia. Quando a pessoa humana é considerada apenas mais um ser entre outros, que provém de jogos do acaso ou de um determinismo físico, “corre o risco de atenuar-se, nas consciências, a noção da responsabilidade”. Um antropocentrismo desordenado não deve necessariamente ser substituído por um “biocentrismo”, porque isto implicaria introduzir um novo desequilíbrio que não só não resolverá os problemas existentes, mas acrescentará outros […]. Se a crise ecológica é uma expressão ou uma manifestação externa da crise ética, cultural e espiritual da modernidade, não podemos iludir-nos de sanar a nossa relação com a natureza e o meio ambiente, sem curar todas as relações humanas fundamentais […]. Com efeito, não se pode propor uma relação com o ambiente, prescindindo da relação com as outras pessoas e com Deus. Seria um individualismo romântico disfarçado de beleza ecológica e um confinamento asfixiante na imanência. (CARTA ENCÍCLICA LAUDATO SI. DO SANTO PADRE FRANCISCO SOBRE O CUIDADO DA CASA COMUM, 2015, p. 118-119).
Ao se discutir paradigmas, se deve compreender o real, desempenhando a função de organizar, por meio de conceitos, a matéria que foi objeto de observação, para que seja compreendida no complexo mundo real.
Em relação às ciências naturais, a concepção de paradigma articula teoricamente uma série de leis científicas que estabelecem relações de causa e efeito. Se esta lei for rejeitada por meio da experiência, o paradigma não se sustenta. Assim, compreende-se que um paradigma não se encaixa em todas as variáveis dependentes, independentes ou intervenientes ao tentar explicar um tema de estudo.
A análise paradigmática das relações internacionais do Brasil será construída por meio da observação empírica da História, buscando compreender os processos políticos de emancipação brasileira em relação às leis que fundamentam a relação com o meio ambiente.
Compreende-se que por trás de um paradigma existe uma concepção de nação que um povo ou seus dirigentes fazem de si mesmos. Esta concepção tem a ver também com a visão que este país projeta do mundo. Coadunam-se, assim, a concepção de si e a concepção que se tem do mundo, criando-se uma identidade cultural.
CONCLUSÃO
Constatou-se que no Século XXI houve transformações de cunho econômico, social e político, as quais sofreram influência da especulação capitalista. Nesse âmbito, a Globalização e as mudanças impostas repercutiram sobre a concepção do Estado do Bem-Estar Social. Nesse sentido, o Estado passa a deter novas funções, com o fomento ao livre comércio e a instituição da integração regional, a qual facilitou a comunicação entre o mercado, os Governo, e as empresas e nações.
A integração econômica é considerada um processo que tem o objetivo de organizar o comércio entre os países e a produção de bens e promover acordos bilaterais ou multilaterais. Embasado nesta concepção de organização comercial, os elementos formadores das unidades participantes são fundidos, transformando-se em organização que será responsável por reproduzir a imagem de cada agente econômico em uma escala maior, abrangendo as discussões sobre o meio ambiente entre os espaços nacionais e espaços regionais, assim como, discussões perpassando pela soberania e supranacionalidade.
Esses acordos de integração relacionam-se a diversos escopos (econômico, comercial, político, ambiental, por exemplo), acordos de cooperação. Destacam-se nesses acordos, discussões tais como sustentabilidade, otimização dos fatores de produção, abrindo-se nesse interim espaço para citar, no que tange ao escopo ambiental, as relações entre economia, comércio e sustentabilidade, levando ao raciocínio de que para haver crescimento ou desenvolvimento econômicos, não necessariamente demandará impacto ambiental. Nesse aspecto, conforme a Encíclica Laudato Si, constata-se que as relações econômicas, especialmente em tela, devem ocorrer primordialmente pela manutenção sustentável do ambiente associado à profícua estratégia logística.
Alerta-se que a questão ambiental se consagrou como um elo motivador das relações de cunho econômico, sendo seu uso amparado por Convenções, Tratados e Normas, que buscam arbitrar a relação jurídica para a sua fiscalização.
Diante do exposto, constata-se que não se deve usar de forma indevida o meio ambiente, arriscando a provocar impactos e danos. Ciente desse fenômeno, alguns organismos internacionais adotaram instrumentos legais de apoio, no intuito de promover a preservação dos recursos naturais e a manutenção de um ambiente saudável.
Depreende-se que o homem é responsável pelos atos que pratica, não devendo escolher agir de forma lesiva aos direitos alheios. Uma vez incorrendo nesse dano deverá ser responsabilizado por tal fato. Esses aspectos cruciais devem nortear sistemática e peremptoriamente a dinâmica do comércio exterior entre as nações, comércio esse, que historicamente perpassa pelo mar e pelos ambientes terrestres.
Padre Antonio Augusto D. de Andrade, e membro do clero do Rio de Janeiro, Filósofo, Teólogo e Historiador. Possui especializações em História e Cultura Afro-indígena Brasileira e Tutoria em Educação a Distância. É doutorando em Ciências da Educação, com ênfase em educação ambiental, pela Universidade Columbia de Assunção, PY. Suas pesquisas versam sobre fundamentos históricos, teológicos e filosóficos da Pastoral da Ecologia Integral na ArqRio.
Contato: antonioandradepy@gmail.com
REFERÊNCIAS
BACHELARD, G. A poética do espaço. (Trad. Antônio de Pádua Dunesi) São Paulo: Martins Fontes, 2005.
BÍBLIA. Português. Bíblia sagrada. Tradução de Padre Antônio Pereira de Figueredo. Rio de Janeiro: Encyclopaedia Britannica, 1980. Edição Ecumênica.
BOSWORTH, A. et al. Ethics and biodiversity. Bangkok: UNESCO, 2011, p. 32-33 (Tradução nossa). Disponível em: . Último acesso em: 28 abr. 2022.
BOURDIEU, P. & WACQUANT, L. An Invitation to Reflexive Sociology. Chicago: The University of Chicago Press, 2004.
BOFF, L. Tempo de transcendência: o ser humano como um projeto infinito. Petrópolis, RJ:Vozes, 2009.
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