Diálogos sobre a presença da Igreja nos novos espaços digitais é destaque no Seminário de Comunicação 2022

A 9ª edição do Seminário de Comunicação da Arquidiocese do Rio de Janeiro aconteceu, entre os dias 13 e 16 de setembro, no Centro de Estudos do Sumaré. Com o tema: “A Igreja digital: Educar a comunidade para o novo humanismo”, o evento investiu em profissionais que atuam neste universo das novas tecnologias e mídias digitais, com a grande perspectiva de proporcionar ao clero, aos religiosos, aos membros de pastorais e comunicadores católicos experiências de imersão nesse futuro das tecnologias de informação e comunicação, cada vez mais presentes nas vidas das pessoas.

Este ano, o Seminário de Comunicação aconteceu presencialmente e nas modalidades híbrida e on-line, e teve cerca de 200 participantes. Para o vigário episcopal da Comunicação Social da Arquidiocese do Rio de Janeiro e coordenador do Seminário, padre Arnaldo Rodrigues, o Congresso teve êxito em sua proposta, por apresentar o que há de mais atual no mundo globalizado.

“O Seminário de Comunicação deste ano contou com a participação de diversas dioceses, institutos e congregações religiosas em todo o Brasil. Foi, realmente, um momento de grande aprofundamento de estudos e partilhas, auxiliado pelos profissionais que estavam presentes, como professores e teólogos, em todo o Seminário de Comunicação. Foi um evento que ajudou a Igreja, de modo geral, sobretudo as pessoas participantes aqui do nosso evento, a compreender um pouco mais as realidades que vivemos neste momento, nas quais a Igreja está inserida neste espaço digital. Foi muito proveitoso e realmente cumpriu a expectativa do que foi proposto”, celebrou padre Arnaldo.

O arcebispo da Arquidiocese do Rio de Janeiro, Cardeal Orani Tempesta, destacou a importância do Seminário para toda a comunidade. “Era de interesse não só dos padres, mas também dos leigos, das religiosas e da Pastoral da Comunicação em geral. E começamos o espaço para a Arquidiocese do Rio de Janeiro, depois abrimos para o Regional Leste 1 da CNBB e seguimos para todo o Brasil”, salientou o cardeal.

A primeira a iniciar os estudos foi Adriana Andrade Braga, professora associada no Programa de Pós-Graduação em Comunicação da PUC-Rio. A especialista apresentou o tema: “Ecologia das mídias e nas mídias católicas”. Ela explicou que todas as tecnologias, ferramentas e instrumentos são mídias. “O termo ‘mídias’ é mais usado para se referir aos meios de comunicação. Mas para a ‘Ecologia das Mídias’, mídia se refere ao objeto técnico, uma criação humana, para a mediação das pessoas com o mundo físico”, ressaltou Adriana.

Para Adriana, evangelização passa por um caráter muito humano de relacionamento, e a interação nas mídias precisa ultrapassar o âmbito da catequização tradicional em termos de linguagem. “É preciso todo um ritual de sociabilidade inicial para estabelecer uma relação que seja mais igualitária com a pessoa. E isso é um padrão recorrente em todo o mundo globalizado. Mas a criatividade nessa interação é a grande chave para o sucesso da comunicação. No mesmo ambiente é possível fazer um conteúdo sério e objetivo, e um outro conteúdo mais descontraído como em chat e fórum, mecanismos que possibilitam espaços para horizontalizar o diálogo nas mídias”, explicou.

Cinema, séries e ficção foram apresentados como poderosas ferramentas de comunicação. Tatiana Siciliano, diretora do Departamento de Comunicação da PUC-Rio, falou sobre o tema: “As tramas da comunicação: ficção seriada para a construção de futuros”. Para ela, ficção e realidade são narrativas de construção da nossa visão de mundo, que estimulam a pessoa a pensar, discernir o que é real ou não, além de educar a sociedade para um novo humanismo. “As narrativas e ficções têm mudado o comportamento da sociedade no decorrer do nosso tempo. Se eu quero trazer alguém para as minhas ideias, a ficção pode ser muito potente. Não é à toa que temos o storytelling (habilidade de contar histórias utilizando narrativas envolventes e recursos audiovisuais) dentro da propaganda, cada vez mais usado pelas empresas. As narrativas constroem o imaginário de visões de mundo”, sublinhou.

Tatiana ponderou que evangelizar por meio da ficção pode ser um meio criativo. “Podemos produzir uma narrativa contando a história de um testemunho, como o mito de um herói, por exemplo. Um heroísmo de superação. Isso é ‘ficcionalizar’ uma trajetória de vida, um testemunho. É possível atrair e sensibilizar as pessoas por meio da ficção. E é bom unir com as redes sociais para engajamento. Mas atenção ao formato e à abordagem”, ponderou.

Os conferencistas tiveram a preocupação de transmitirem conhecimentos que abrissem caminhos para a Igreja, de tal maneira que pudessem colaborar, através de sua essência e valores, dentro desse universo digital. Com isso foram expostos temas como cidadania das redes, personalidade jurídica no mundo digital e criatividade e tecnologia na Igreja.

O coordenador da área de Inovações Tecnológicas do Instituto Monte Verde – Intelligency Lab, Leonardo Tadeu dos Santos Duarte, falou sobre “Cidadania das redes: desdobramentos sobre a personalidade jurídica no mundo digital”. Ele disse que estamos construindo um novo pacto social mediado pela inteligência artificial, que sucede o pacto social da relação entre os seres humanos e o Estado. “Essa nossa cidadania OnBoard pode ser manipulada. Ela pode está comprometendo a nossa própria vontade. Isso porque a inteligência artificial não está mudando só o mundo, ela está mudando a nossa mente. A nossa vontade que a gente acha que é tão livre, mas talvez não seja”, alertou.

Duarte disse ainda que estamos vivendo em um mundo disruptivo. “E a partir do momento que cedermos os nossos dados, fazemos da máquina uma extensão de nós. E, aos poucos, entramos em uma gaiola dourada, que dificilmente vamos conseguir sair. E isso é voluntário porque nós gostamos de viver nesse cyberespaço. E se olharmos, segundo a Constituição, a personalidade jurídica é um direito fundamental. Se a gente for olhar pelo prisma do Direito internacional, a personalidade jurídica é um direito da Declaração Universal do Homem, então a personalidade é inerente à condição humana. E dentro do Código Civil, toda pessoa é capaz de direitos e deveres da ordem civil”, evidenciou Duarte ao explicar sobre o domínio da personalidade jurídica no mundo da tecnologia e da internet.

A conferência de Carla Bastos, CEO da empresa MKT e RTC, foi sobre “Inovação e tecnologia na Igreja, um caminho com novos olhares”. Segundo a especialista, neste mundo de novidades e de novas ferramentas, nós devemos conhecer a base. “Cada ferramenta está direcionada para um tipo de público. Definir bem e saber onde o teu público está é o sine qua non para escolher a mídia que vamos usar. Isso porque muda completamente a forma que a Igreja chega a sua audiência. As vantagens do uso das mídias sociais na Igreja é que cria apoio e proximidade, como os influenciadores têm com o público. Essa oportunidade é conseguir fazer uma coisa diferente, criar um complemento que causa uma amplitude na experiência física do que já vivemos. É o conteúdo que vai além. A gente precisa trazer mais experiência para essa vida, que é a vida das Igrejas”, declarou.

 

Inteligência artificial, tecnologia e religião

“A transformação digital é importante, mas não podemos levar o sacramento para o metaverso. Não dá para levar a Eucaristia para o digital”, ajuizou Cristiano Amon, presidente e CEO da Qualcom, na Califórnia, EUA, ao iniciar sua palestra sobre “Tecnologias do futuro: oportunidade para direcioná-las para o bem”. Amon ministrou sua conferência no formato remoto. E apresentou tendências tecnológicas que estão transformando o mundo e que as indústrias já oferecem. Esse mundo do ambiente digital deve ter a contribuição da religião. “Nós podemos utilizar. Esta é a melhor forma que podemos nos prevenir. Tudo estará conectado nessa tendência tecnológica. E vai acontecer ao longo dessa década, como uma vasta relação de tecnologias da comunicação. Cada G é, mais ou menos, um intervalo de 10 anos”, calculou.

O presidente da Associação Brasileira de Centros de Inclusão Digital (ABCID), Mário Brandão, exibiu o tema: “Metaverso, o que é e o que está por vir”. O profissional explicou este assunto pouco conhecido pela sociedade, resumindo que este ambiente virtual imersivo é a evolução natural da internet, unida à realidade virtual e à realidade aumentada. “Atualmente, existem 150 espaços no metaverso. Nós estamos falando do futuro do espaço digital, do futuro dos cidadãos, no qual estaremos coexistindo. Então se já temos dificuldade da discussão de cidadania nessa nossa internet, imagina no futuro, quando a discussão será ainda mais importante, no momento que teremos os nossos corpos representados no mundo digital”, evidenciou.

Segundo Brandão, instituições como a Igreja e as instituições civis têm que participar desse processo de construção. “E o primeiro passo é experimentar, é explorar esse universo. Existem grandes desafios para instituições como a Igreja Católica. O importante é estar consciente desse espaço. A Igreja não pode demonizar esses espaços e ver como negativos. Porque é lá que as pessoas estão convivendo. É o novo espaço social. Não será possível simplesmente retirar as pessoas desses espaços. É preciso adentrar nesses espaços e educar com valores e regras que possam construir seus próprios espaços”, destacou.

Gabriel Brasil, diretor de Realidade Aumentada e Virtual, da empresa QReal, de Nova York, EUA, debateu o significado do humanismo no metaverso.

Para ele, a Igreja já existe dentro de um universo capitalista e é uma instituição que, há mais de dois mil anos, colabora de maneira atuante na sociedade. “A Igreja é mestra em construir pontes com entidades privadas. Então, ela deve existir dentro desses espaços que foram criados por entidades privadas. Mas deve construir e participar da construção dos seus próprios espaços lá dentro. Isso é necessário que tenha consciência de quais são os meios”, sublinhou.

Padre Arnaldo comentou que essas conferências foram o início de um grande projeto que a Arquidiocese do Rio de Janeiro está construindo.  “O Seminário de Comunicação está na 9ª edição e, desde o início, se propôs a oferecer mais um espaço de reflexão a toda a Igreja no Brasil, reunindo comunicadores de diversas partes do Brasil e do exterior, com pessoas interessadas, responsáveis por departamentos de comunicação, colaboradores de dioceses, institutos e congregações, para refletir exatamente o papel da Igreja dentro desses espaços. Então, a arquidiocese sempre se preocupou de ser um local de partilha, um local de acolhimento. E graças a Deus nós temos atingido bastante esses objetivos, em ser um ponto de referência para aprofundar temas importantes que tocam a Igreja no dia a dia”, destacou.

Além das conferências, o Seminário de Comunicação possibilitou momentos de orações, como a do Ângelus, e teve Santa Missa, mesa de debates e exibição de filme. E, no terceiro dia, os participantes visitaram o laboratório da Apple do Rio de Janeiro.

O Seminário terá continuação ainda neste ano com cursos mensais para os participantes,  promovidos pela PUC-Rio até novembro de 2023.

A 10ª edição do Seminário de Comunicação da Arquidiocese do Rio de Janeiro acontecerá entre os dias 15 e 17 de setembro de 2023. O interessado pode acessar o site seminariodecomunicacao.com.br .

 

Rita Vasconcelos

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