“Não tenhas medo! Doravante serás pescador de homens” (Lc 5, 10)
Do Rio Pardo ao Rio de Janeiro, o Cardeal Orani João Tempesta, O.Cist, testemunha o “navegar em águas mais profundas” (Lc 5, 10) com passagens pelo Rio Preto e por seus “afluentes” na Amazônia. Do interior do Estado de São Paulo, onde nasceu e deu seus primeiros passos como bispo, ao exercício do ministério episcopal em uma das mais desafiadoras megalópoles do mundo, o religioso teve a sua atuação “ungida” pelas águas; as mesmas de onde o Senhor fez sair “tamanha quantidade de peixes que as redes se rompiam” (Lc 5, 6) ou das quais “apareceu” a padroeira do Brasil que, como Mãe de Jesus, igualmente se manifesta em uma das maiores festas marianas do planeta: o Círio de Nazaré (que Dom Orani celebrou nos seus quatro anos como arcebispo na terceira arquidiocese mais antiga do país, Belém do Pará).
“Ide por todo o mundo, proclamai o Evangelho a toda a criatura” (Mc 16, 15)
São José do Rio Pardo foi elevada à condição de abadia em setembro de 1996. Em dezembro daquele ano, o monge Orani João Tempesta fora confirmado seu primeiro abade. O entendimento humano, considerado aquele chamado à missão, muito provavelmente orientou o pensamento acerca de um tempo maior de permanência na função. Não aconteceu! Pouco mais de dois meses depois, em 26 de fevereiro de 1997, o Papa, hoje São João Paulo II, fez do abade o terceiro bispo diocesano de São José do Rio Preto.
No Noroeste do Estado de São Paulo, a diocese rio-pretense tinha contornos gigantescos; tanto que a partir dela, anos mais tarde, surgiram as igrejas particulares de Catanduva e Votuporanga. Outro desafio seria suceder Dom José de Aquino Pereira, no posto por quase 30 anos. No dia 25 de abril de 1997, Dom Orani fora ordenado na sua cidade Natal e tomara posse na diocese no dia 1º de maio onde, vez ou outra, declara “ter aprendido a ser bispo”.
“Eu sou o bom pastor: o bom pastor dá a sua vida pelas suas ovelhas” (Jo 10, 11)
Nessa etapa, e que fortemente interessa a esse texto, vale o resgate das ações pastorais realizadas por Dom Orani no início de seu episcopado (e que se refletem, hoje, em realizações hodiernas da Igreja). Não cabe, porém, um ordenamento cronológico fiel de tudo o que foi realizado uma vez que, tão assertivas propostas ou seguem tal qual foram concebidas ou são o alicerce daquilo que figura em construção. Por outro lado, seria impossível relatar em um único texto todo o bem gerado pelo, agora, Cardeal Tempesta.
Hoje, também via Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, as lideranças são chamadas a descentralizar os territórios paroquiais para permitir alcançar o objetivo das Diretrizes Gerais da Ação Evangelizadora da Igreja (2019/2023): “evangelizar no Brasil cada vez mais urbano, pelo anúncio da Palavra de Deus, formando discípulos e discípulas de Jesus Cristo, em comunidades eclesiais missionárias, à luz da evangélica opção preferencial pelos pobres, cuidando da Casa Comum e testemunhando o Reino de Deus, rumo à plenitude”. Há mais de 20 anos, no final da década de 1990, Dom Orani já era um entusiasta das Redes de Comunidades. Contemplada no Plano de Pastoral, foi prioridade na diocese e um dos trabalhos de maior envergadura do bispo à época.
Sabedor de que “onde está o bispo aí está a Igreja”, conforme ensina Santo Inácio de Antioquia, Dom Orani passou a se “bilocar” por meio dos textos de apresentação dos subsídios da Rede de Comunidades, mas não só; também em artigos publicados em diversos veículos ou no diálogo verdadeiro, franco e aberto com a imprensa. Como já exposto, e em uma leitura particular, as dimensões territoriais da Diocese de São José do Rio Preto à época exigiam a difusão de mensagens por todos os meios possíveis (e Dom Orani soube, como ninguém, usá-los para proclamar o Evangelho).
Da destacada articulação (em um período em que as redes sociais e o “ciberespaço” ainda ganhavam contorno), o epíscopo fora confirmado presidente da Comissão Episcopal Pastoral para a Educação, Cultura e Comunicação da CNBB, ofício que, posteriormente, se desdobraria na presidência do Conselho de Comunicação Social do Congresso Nacional.
Considerados os desafios atuais, é impossível pensar a Igreja sem bases sólidas fincadas no processo comunicacional que exige domínio da linguagem e disposição aos novos meios; realidades verificadas por Dom Orani quando, ainda presidente da Comissão da CNBB para o setor, foram retomadas as discussões para a criação do Diretório de Comunicação da Igreja no Brasil (efetivado como documento número 99).
Ainda quando bispo de São José do Rio Preto, Dom Orani desejou “caminhar junto” com os jovens. À época, no noroeste paulista, foi de sua inspiração a realização de uma ampla consulta para perceber as realidades, conhecer os anseio e tocar o rosto dos mais novos: o Sínodo da Juventude foi um sinal profético que hoje faz sintonia com a convocação do Papa Francisco em prol de uma “Igreja Sinodal” que viva a comunhão, incentive a participação e oriente para a missão.
Aquela “semente sinodal” plantada no coração de Dom Orani certamente frutificou, anos mais tarde, na Jornada Mundial da Juventude organizada pela Arquidiocese de São Sebastião do Rio de Janeiro que, então, já contava com o religioso como seu arcebispo metropolitano. O encontro foi, igualmente, o primeiro grande sinal do “jeito Francisco de ser”; pastor sempre desejoso de carregar o “cheiro das ovelhas”.
Ainda no noroeste paulista, a agenda do bispo diocesano mais parecia um mosaico: eram encontros, reuniões, celebrações e o sempre crescente desejo de estar com o povo. Desejo esse que ardia quando da preparação para as Santas Missões Populares. Os diocesanos, entre etapas de preparação e organização, já visualizavam uma fase especial: as missões de casa em casa. Foi em meio a essa expectativa que veio a notícia da transferência de Dom Orani para a Arquidiocese de Belém do Pará. Era 13 de outubro de 2004.
“Que todos sejam um” (Jo 17, 21)
Foram sete anos de trabalho no noroeste paulista. É a Palavra de Deus que indica que o número sete faz referência ao completo… Dom Orani tão bem ocupou espaços que o único vazio por ele gerado se deu no coração dos diocesanos rio-pretenses que enviaram em missão um grande pastor. Em uma época em que a Amazônia passava a ser elencada com mais força como prioridade da Igreja, o agora arcebispo já tinha muito a partilhar na Região Norte do país.
Para não ser injusto, é preciso citar outra realização do religioso em terras paulistas: a Festa da Unidade. O evento, a cada ano, se firmava como um impulso para a vida pastoral da Diocese de São José do Rio Preto. Diante de tantas ações proféticas, essa seria apenas mais uma; e que se encaixa perfeitamente no contexto das celebrações pelos 25 anos de ordenação episcopal do cardeal: nas margens do Rio Pardo ou do Rio Preto, navegando na Amazônia ou no Rio de Janeiro, “todos somos um” na alegria por tão frutuoso ministério.
André Botelho
Jornalista, Diocese de São José do Rio Pr